Crônica de um Corpus Christi ituano

Na última quinta-feira, primeira depois da oitava de Pentecostes, a cidade de Itu viveu momentos de verdadeira apoteose eucarística ao celebrar solenemente o dia de Corpus Christi.
Logo após a missa da manhã, na matriz da Candelária, o Santíssimo Sacramento foi exposto no trono lá no alto do altar-mor, onde permaneceu em constante adoração até a tarde, quando foi guardado para que tivesse lugar a missa solene, cantada à grande orquestra, com a participação de inúmeros fiéis e centenas de comunhões.
Imediatamente seguindo-se à missa o Santíssimo foi novamente exposto, agora sobre o próprio altar, incensado, dando-se início à procissão pelas ruas da cidade. Com a Irmandade de São Benedito à frente como em todas as procissões da paróquia, o cortejo iniciou seu curso subindo a rua Barão de Itaim. O povo, em número jamais visto, seguia em filas pelas laterais, enquanto no centro da procissão sucediam-se as diversas irmandades e associações da paróquia, cada qual com suas insígnias, bandeiras e estandartes. Primeiro se viam as dezenas de crianças do catecismo e as irmandades da própria matriz: Círculo Católico, Santo Antônio, Boa Morte e N. Sra. das Dores; depois vinham o Apostolado da Oração e as Congregações Marianas do Bom Jesus, seguidos pela Pequena Liga, Congregação de Santa Terezinha, Liga Católica Jesus, Maria, José e Congregação Mariana do Carmo. Na sequência, ostentando seus vistosos hábitos religiosos, as ordens terceiras do Carmo e de São Francisco e, finalmente, a Irmandade do Santíssimo Sacramento, à qual cabia a organização dos festejos. Com seus imponentes tocheiros e opas cor-de-vinho bem acomodadas sobre alinhados ternos feitos das melhores fazendas, abriam caminho para o pálio com o Santíssimo. O pároco, vestindo riquíssimo pluvial e véu umeral, partes do conjunto de paramentos recentemente adquiridos pela paróquia e vindos de Espanha, levava respeitosamente a custódia, tendo as bordas da capa sustentadas pelo diácono e subdiácono, os mesmos da missa. Ao lado, os dois tocheiros de prata e, à frente, as campainhas e dois turíbulos fumegantes, além do clero e de grande número de coroinhas. Atrás do pálio somente a banda de música a executar suas tocantes marchas religiosas.
Já em meio às centenárias palmeiras imperiais e ao badalar austero dos sinos da igreja do Carmo, podia-se avistar belíssimo altar montado em frente ao anteparo da igreja, no qual, uma vez cantado o Tantum Ergo pelo coro local, o prior dos carmelitas deu a primeira bênção aos fiéis, de joelhos e em piedosa atitude de respeito.
Dali a procissão seguiu até a rua do Patrocínio, quando então todos podiam avistar artístico arco de flores preparado pelas monjas concepcionistas do conventinho em homenagem a Nosso Senhor, em frente à igreja de N. Sra. das Mercês, cujo repicar dos sinos já se confundiam ao da igreja do Patrocínio. Ali, frente ao altar montado na porta da igreja e com vistas a um tapete de folhagens e flores preparado em frente ao templo, o capelão local deu a segunda bênção eucarística, não sem antes o canto do Tantum Ergo pelo orfeão das alunas do colégio. Estas, notadamente as internas, dispunham-se à esquerda da igreja, com seus tradicionais uniformes, enquanto as numerosas irmãs de São José, em seus hábitos negros, símbolos de sua doação a Cristo, posicionavam-se à direita.
Findos os ritos no Patrocínio, a procissão subiu até a rua dos Andradas, por onde seguiria até o largo de São Francisco. Ali a visão que se tinha do cortejo era deslumbrante, com suas intermináveis irmandades entoando cantos eucarísticos e rezando, enquanto os moradores enfeitavam suas janelas e a rua com flores, para a passagem da custódia.
Do largo de São Francisco a procissão seguiu pela rua Floriano Peixoto até alcançar a igreja do Bom Jesus, frente à qual os operários da Fábrica São Luiz haviam preparado artístico tapete de serragem colorida, reproduzindo a aparição do Sagrado Coração de Jesus a Santa Margarida Maria. Ali, executado o imponente Tantum Ergo de “Corpus Christi” pelo coro local, o padre superior dos jesuítas ministrou mais uma bênção aos fiéis, enquanto os sinos repicavam festivos e pétalas de rosas eram lançadas de uma coroa instalada nos altos da fachada da igreja.
Retomando a procissão para seu derradeiro trajeto, a rua Paula Sousa, chegou novamente à matriz da Candelária, onde outro altar, montado no adro da igreja, a esperava. Ali o pároco, que a partir do Bom Jesus havia passado o ostensório a seu vigário coadjutor, já havia assumido o púlpito e organizava a chegada dos fiéis. Finalmente, acomodado o Santíssimo em seu trono, após vibrante pregação proferida por um sacerdote jesuíta e o Tantum Ergo executado pelo coro paroquial e orquestra, todos receberam a última bênção eucarística, enquanto os sinos da matriz bimbalhavam festivos, rojões espoucavam e a banda, em marcha batida, executava o Hino Nacional, invocando copiosas graças para a pátria brasileira.
Cumpridas as preces finais, sob grande aplauso e “vivas” a Sagrada Hóstia foi levada novamente ao sacrário, encerrando-se as imponentes e piedosas celebrações de Corpus Christi na Roma Brasileira.