Mês Missionário: acolher também é evangelizar
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Dom Arnaldo Carvalheiro Neto
Bispo Diocesano de Jundiaí

“’E quando te vimos estrangeiro, e te acolhemos?’ ‘Em verdade vos digo que quando o fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes’” (cf. Mt 25, 38.40).

A imprensa noticiou, a internet repercutiu e o caso chocou o mundo. Em janeiro de 2022 o jovem congolês Moise Kabagambe, de 24 anos, foi espancado até a morte por três homens na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro. Ele cobrava o pagamento de duas diárias atrasadas por seu trabalho em um quiosque. Por que mataram Moise? De que recônditos do coração alguns seres humanos extraem tanto ódio?

Moise Kabagambe, um homem negro, saiu da República Democrática do Congo em 2011, aos 11 anos, junto com três irmãos, fugindo da guerra, da fome e de doenças. Em boa medida, seu assassinato no Brasil expõe a dificuldade humana em acolher o estrangeiro como irmão, em compreender suas dificuldades na busca da sobrevivência em terra estranha. Revela que um coração sem amor está sempre pronto a descarregar seu ódio sobre aquele que lhe parece diferente, seja na cor da pele, seja na língua, seja na classe social, seja na crença.

Em outubro, celebramos na Igreja, o Mês Missionário, com o intuito de renovar o nosso compromisso de anunciar o Evangelho a todas as gentes e em todos os cantos, compreendendo que o acolhimento dos refugiados está intrinsecamente associado com essa primordial tarefa cristã. Pois, “acolher bem também é evangelizar”, como reza o lema do Santuário Nacional de Aparecida. O amor não vê fronteiras. Se as vê, não é amor.

Não se admite que governantes construam muros para barrar fisicamente o ingresso de estrangeiros em seus países, independentemente das legislações migratórias, e que a burocracia sirva à crueldade de separar famílias. Igualmente, não se pode aceitar que milhões de pessoas morram em alto mar, a bordo de barcaças precárias e sem alimento, almejando a um mero atracadouro. Não se concebe que o Brasil, país em boa dose erguido por mãos imigrantes, exclua hoje os que vêm de fora e chegue ao extremo de lhes tirar a vida.

Ninguém deve ser excluído, nos ensina o Evangelho e reforça-nos o Papa Francisco, que em 29 de setembro último, na sua Mensagem para o 108º Dia Mundial do Migrante e do Refugiado 2022, falou-nos sobre os migrantes, os refugiados, as pessoas deslocadas e vítimas do tráfico: “A construção do Reino de Deus está com eles, porque sem eles não seria o Reino que Deus quer. A inclusão das pessoas mais vulneráveis é uma condição necessária para a cidadania plena”.

Francisco nos diz que a partilha de diferentes expressões de fé e devoção constitui oportunidade privilegiada para viver plenamente a catolicidade do Povo de Deus. Ao concluir sua Mensagem, o Papa rogou a Deus para que floresça a fraternidade onde houver exclusão e para que sejamos construtores do seu Reino junto com os habitantes das periferias.

Em clara consonância com tais palavras, o Papa Francisco celebrou, no dia 9 de outubro, a missa de canonização de João Batista Scalabrini, Bispo de Piacenza que no final do Século XIX fundou as Congregações dos Missionários e das Missionárias de São Carlos com a missão específica de servir aos migrantes. São João Batista Scalabrini, antes Pai dos Migrantes, é o Santo dos Refugiados! Cabe a nós invocá-lo em nossas jornadas missionárias.
Como acurado observador de sua época, Scalabrini fundou um instituto para surdos-mudos e uma organização assistencial para mulheres abandonadas das zonas rurais. Mas o trabalho que mais o instigava era relacionado aos migrantes. Criou a Casa dos Migrantes para acolher milhares de europeus que deixavam seus lares e pátrias em busca de sobrevivência digna. Em 1887, fundou a Congregação dos Missionários de São Carlos Borromeu, no âmbito da qual hoje atuam os padres scalabrinianos para assistência religiosa, moral e social a migrantes em todo o mundo. Seu exemplo permaneceu vivo e agora é redivivo pela sua canonização.

Cremos que o espírito de São João Batista Scalabrini conduz os trabalhos em nossa Diocese. No capítulo de Jundiaí, especialmente, há muito a mostrar e, por óbvio, ainda muito a fazer. De todo modo, os exemplos concretos de ação missionária devem ser levados ao conhecimento de todos. Exemplos como o Projeto Caminhos de Solidariedade da Diocese, articulado pela Cáritas Diocesana de Jundiaí, em atendimento a famílias de refugiados vindos da Venezuela em 2019 e, mais recentemente, às famílias refugiadas e desabrigadas na cidade de Campo Limpo Paulista. O Projeto reúne, além da Cáritas Diocesana de Jundiaí, o Centro Scalabriniano de Promoção do Migrante (Cesprom), a Sociedade de São Vicente de Paulo, a Cáritas Paroquial Nossa Senhora Mãe dos Homens e Santo Antônio de Pádua, de Louveira, a Pastoral Diocesana do Migrante, o Serviço de Obras Social (SOS), as pastorais sociais e os movimentos que formam uma rede solidária e comunitária de apoio aos migrantes por meio de ações concretas, como a regularização da documentação de migração, a inserção em bancos de empregos e, por fim, a garantia de moradia e a promoção e inserção na sociedade.

Enalteçamos, neste Mês Missionário, os irmãos missionários da Diocese de Jundiaí que levam o Evangelho e o acolhimento cristão a tanta gente que se depara com a exclusão e, não raro, com o ódio. Nossa gratidão a tantos missionários filhos da Diocese de Jundiaí espalhados pelo mundo inteiro: ao Padre Adriano Ferreira Rodrigues (Pemba, Moçambique), ao Padre Edmilson de Abreu Silva (Caroebe, Roraima, Brasil), aos diáconos Ismael Félix de Sousa e Edisandro de Lima Rocha (São João da Baliza, Roraima, Brasil), que integram o Projeto Missionário do Regional Sul 1 da CNBB; ao Padre Luiz Antônio de Aguiar (Kozu, Japão), e tantos outros presbíteros, catequistas itinerantes e famílias em missão do Caminho Neocatecumenal.

Que o Senhor desperte em todos, clérigos e leigos, o ardor missionário e o zelo pela evangelização.

A todos abençoo.

Dom Arnaldo Carvalheiro Neto
Bispo Diocesano de Jundiaí