Parábola sobre a dupla face  humana e a superacão  da dualidade
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por Olga Sodré

Dominação das mentes,cegueira e surdez mentais.

Cansada da agitada vida na capital, uma professora resolveu morar no interior do estado, após se aposentar da universidade. Durante algum tempo, desfrutou tranquilamente a convivência amigável de uma pequena cidade e de suas atividades religiosas; até que a polarização política e as bolhas das redes sociais passaram a orientar a comunicação entre seus habitantes, propagando ódio, divisão e notícias falsas.
Com a aproximação das eleições governamentais, os ânimos ficaram ainda mais exaltados, revelando a face oculta das pessoas. Sem estar vinculada a nenhum candidato ou partido, a professora evitava discutir e participar das polêmicas políticas; mas se entristecia ao verificar que muitos amigos reproduziam informações infundadas, ataques e acusações distorcidas.
Admirava-se ao perceber que os adversários políticos eram sistematicamente acusados de corrupção, incapacidade, ameaça à vida e ao progresso; enquanto que os próprios candidatos – embora defensores de regimes autoritários e acusados de várias ações ilícitas – eram apresentados como baluartes da democracia, da família e da honestidade. As informações sobre desvios e ações contrárias a estes valores eram simplesmente ignoradas. Essas pessoas tinham olhos, mas não viam; tinham ouvidos e não escutavam.
Acostumada ao diálogo de ideias, a professora ficou estarrecida ao constatar que nenhuma ponderação era capaz de abalar a sombria nuvem do ódio e falsas argumentações. Estas já haviam obscurecido e dominado algumas mentes, tendo nelas implantado declarações ardorosamente defendidas e propagadas até mesmo por autoridades religiosas, pessoas cultas e expoentes da comunidade com os quais a professora convivia fraternalmente.
Pareciam agir motivados por autênticas convicções, valores morais e religiosos; porém todos reproduziam os mesmos discursos, como se fossem movidos pelas cordas de uma ideologia em comum. Percebendo que tal situação poderia permanecer e até agravar-se – durante e após as eleições -, temeu o aumento da violência, mortes e destruições; como acontecera na disseminação da dominação nazista alemã. Os que, então, seguiam Hitler, tornaram-se cegos diante das atrocidades cometidas.
Relacionou este processo à dualidade humana, manifestada na coexistência interior do amor, verdade e fraternidade com as forças antagônicas do ódio, mentira e insensibilidade ao próximo. Observou a batalha delas no campo espiritual e no campo social. Verificou que os profetas bíblicos já alertavam a respeito; e que Cristo encarnou amor, verdade e fraternidade, ensinando-nos a enfrentar e vencer suas tendências opostas pela constante afirmação destas forças.
Refletindo a respeito, a professora concluiu que o caminho para seguir Cristo – embora difícil – implica permanecer firme no amor, verdade, unidade e fraternidade, mantendo o vínculo da paz em suas relações. Decidiu, portanto, impedir o avanço de qualquer resíduo de sua própria cegueira e surdez, lutando interna e socialmente contra a difusão do ódio, divisão, mentira, guerra e insensibilidade ao próximo.
Sentindo-se inundada pelo amor que continuava a existir dentro dela por aquela cidade e pelas amizades ali construídas, transformou-o num poderoso escudo contra o avanço das forças destrutivas em seu próprio ser. Descobriu ser possível opor-se a tais tendências e criticá-las, sem deixar-se contaminar – o que daria a vitória ao ódio, mesmo se este fosse externamente vencido.