“Quando assumimos o Matrimônio, o ‘Eu’ precisa dar lugar ao ‘Nós’!”
Separações e divórcios têm se tornado cada vez mais comuns e revelam a fragilidade das famílias nos dias de hoje. Para o diácono Marcos Nunes, um dos fatores que levam a essa realidade é a centralidade no indivíduo que, mesmo dentro do casamento, continua buscando apenas sua felicidade, esquecendo de seu cônjuge e até mesmo de seus filhos. Em entrevista ao jornal “A Federação”, Marcos destaca que a Igreja tem um papel fundamental frente a essa realidade: apoiar, orientar e ajudar as famílias para que encontrem o caminho “à luz da Palavra e da Misericórdia de Deus”.
Marcos Nunes é diácono há 23 anos e atualmente realiza sua missão na paróquia São Judas Tadeu, onde auxilia as diversas pastorais e é Diretor Espiritual do Encontro de Casais com Cristo (ECC). Em sua trajetória na Igreja, participou de diversos movimentos e pastorais, como Renovação Carismática Católica (RCC), Encontro de Casais com Cristo (ECC) e Movimento de Irmãos com Cristo (MIC). Também foi Ministro Extraordinário da Comunhão Eucarística e atuou na Pastoral do Dizimo da Paróquia São Luís Gonzaga.
Marcos é casado há 48 anos com Sônia. Eles são pais de Sílvia Renata, 47 anos, Cláudia Regina, 46, e Débora Cristina, 43. E também são avós de Natália, de 27 anos, e Augusto, de 19. Na vida profissional, Marcos é marceneiro, tendo se dedicado ao seu próprio negócio de projeto e construção de móveis, além de outras peças de marcenaria.
Jornal “A Federação”: As reflexões do Ano “Família Amoris Laetitia” deste último mês têm como tema principal a fragilidade que as famílias enfrentam. Nas palavras do Papa Francisco, “somos todos frágeis, e separações, divórcios e convivências se tornaram uma realidade para muitas famílias no mundo”. Em sua opinião, quais são as principais causas dessa realidade de muitas famílias?
Diác. Marcos Nunes: Acredito que essa realidade seja causada pela falta de diálogo entre o casal, a falta de amor verdadeiro e de doação de um para com o outro. Também pode ser causada pela falta de amadurecimento para assumir o Sacramento do Matrimônio e, às vezes, até mesmo a falta de conhecimento do real significado desse sacramento na vida nova que estão assumindo.
JAF: O Papa Francisco chama a atenção que, diante dessas fragilidades, é preciso agir de forma construtiva, dentro dos limites possíveis para cada pessoa: “Há muitos pequenos passos possíveis que as pessoas podem dar, e pequenos passos são sempre agradáveis a Deus.” Em sua opinião, o que as pessoas de uma família que passa por essas fragilidades podem fazer?
DMN: Podemos comparar a vida matrimonial a um jardim. Para mantê-lo bonito e florido, temos que cuidar. Quando o jardim está mal cuidado, cheio de mato e pragas, precisamos de um cuidado maior. Não é somente molhar de vez em quando. Primeiramente precisamos querer ver o jardim florido novamente. Começamos com uma limpeza onde tiramos o mato e as pragas, que no relacionamento são os erros, como mentiras, segredos, falta de respeito e cumplicidade. Após a limpeza, vamos para as flores. Assim como no jardim, o casamento também precisa de podas, para que as flores cresçam bonitas e com força. No casamento essa poda é a poda do orgulho, onde aceitamos nossos erros e também os do cônjuge. Terminada a poda, reviramos a terra trazendo para cima os nutrientes que foram ficando para baixo. Esses nutrientes são as experiências boas que o casal teve: companheirismo, fidelidade, dedicação e respeito. Após essa etapa, precisamos adubar com produtos essenciais para o crescimento das flores: o amor, respeito e cumplicidade. Por último e o mais importante para o Jardim, molhar com abundância com a água símbolo do Perdão, que vai lavar e dar vida nova ao Jardim Sagrado que é o Matrimônio.
JAF: O Papa também lembra que “a Igreja tem a tarefa de ir ao encontro daqueles que desejam permanecer perto de Deus”, mesmo nas famílias que enfrentam essas dificuldades. O que a Igreja pode fazer para acolher essas famílias que sofrem?
DMN: A Igreja tem que acolher com amor, sem distinção, aqueles que vivenciam essa situação. Apoiar, orientar e ajudá-los para que encontrem uma solução à luz da Palavra e da Misericórdia de Deus. Mas é importante lembrar que só há possibilidade de ajudarmos quando o casal ou a família buscam ajuda. Nós, como Igreja, percebendo as dificuldades existentes, devemos intensificar nossas orações por aquela família para que Deus proporcione uma forma de poder ajudá-los sem invadirmos o espaço íntimo do casal, mesmo porque, muitas vezes, eles não permitem interferências na situação que estão vivendo.
JAF: “De forma alguma a Igreja deve desistir de propor o ideal pleno do matrimônio”, afirma o Papa Francisco. Gostaríamos que você esclarecesse qual o ideal do matrimônio para a Igreja. Em sua opinião, ainda há espaço para esse ideal na sociedade de hoje?
DMN: À luz da Palavra de Deus, nós vemos que “o que Deus uniu o homem não separe” (Mt 19,6). Mesmo que venham as dificuldades, as enfermidades, as tempestades, devemos buscar em Deus a força necessária para continuamos, porque pelo Sacramento que recebemos nos tornamos uma só carne. Por isso, a Palavra nos convida a sermos suporte um para o outro. Infelizmente, a busca da nossa própria felicidade, individual, se tornou mais importante. Dessa forma, fica mais difícil de vivenciarmos a primeira parte da pergunta: se aparecerem diferenças e dificuldades, abandona-se tudo para viver “o próprio Eu”. É claro que existem exceções, mas uma grande maioria dos casais vive junto buscando sempre colocar em evidência a sua vida pessoal, as suas coisas, esquecendo que, quando assumimos o Sacramento do Matrimônio, o “Eu” precisa dar lugar ao “Nós”.
JAF: Falando às pessoas das comunidades eclesiais, o Papa diz que “o importante é usar o bálsamo da misericórdia para acalmar as feridas e fazer as pessoas se sentirem acolhidas”. No entanto, o ditado popular diz que “em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”. Em sua opinião, o que as pessoas da comunidade podem fazer para ajudar as famílias que estão vivenciando essas fragilidades?
DMN: Como foi colocado em outra resposta, fica difícil interferir nessas situações sem que sejamos solicitados. Quando tomamos conhecimento de tais situações, devemos interceder junto a Jesus e Nossa Senhora para que haja uma abertura de alguma das partes para que possamos oferecer ajuda. Podemos convidá-los para fazer o Encontro de Casais com Cristo (ECC) ou o Encontro Matrimonial Mundial (EMM), como formas de aproximá-los de Jesus, Fonte de Vida para a vida conjugal. Porque só em Jesus encontramos o bálsamo que cura as nossas feridas e refaz a nossa vida.
JAF: Como mensagem final, o que você diria às famílias que passam por essas dificuldades? Elas podem procurar ajuda na Igreja? De que forma?
DMN: Queridos irmãos – de uma forma muito especial, os casais que são chamados para ser Igreja Doméstica: a nós foi confiada a missão de levar adiante a construção de um mundo melhor, renovado pela condução do Espírito Santo. Portanto, não vos afasteis da Fonte, que é Jesus. Porque o inimigo ruge ao nosso redor tentando destruir nossa base, a família. Mesmo quando tudo parecer impossível, lembrem-se que temos o Deus do Impossível que é por nós. Busquem sempre ajuda onde Deus está, na Eucaristia, na Confissão, nos Sacramentos que nos são oferecidos como força e restauração na caminhada.