Um Externato em Campinas (2)
A esse tempo já haviam sido entaboladas as negociações com a Rvda. Madre Teodora, no sentido de enviar Irmãs para administrarem o hospital e as fundações anexas. Novas operárias têm de seguir. Solicitada a vinda de mais religiosas da velha França, estas não chegaram ainda. É preciso se arrumar com a prata da casa, impor às colmeias já fundadas o sacrifício de uma ou duas Irmãs e constituir assim a nova comunidade.
Madre Ana Felicidade é a nova superiora, Irmã Basília, a farmacêutica e Irmã Ana Justina, a encarregada dos outros afazeres. A 3 de outubro, inscrevem o primeiro doente, um pobre escravo baiano. Outros acorrem em busca do alívio para seus males corporais, e a par do trato carinhoso que lhes é dispensado, encontram a cura de suas enfermidades espirituais, porque a divisa das Irmãs é levar todos a Cristo, conquistando para as fileiras do Rei imortal sempre novos adeptos.
Em sua correspondência com a Madre Provincial e com a Geral, a superiora de Campinas deixa transparecer o sacrifício que lhe custou a troca do Seminário da Glória pela Santa Casa. Sofrera tanto com as educandas, e agora que estas começam a ser mais dóceis, mas afeiçoadas, com hábitos mais cristãos, é obrigada a deixá-las, e ceder a outra alegria de recolher os frutos semeados entre lágrimas e abnegações. A obediência, porém, fala mais alto, e os heroísmos a que se vê obrigada a praticar não tardam a produzir resultados consoladores. A obra encetada com espírito verdadeiramente sobrenatural, atrai as bênçãos de Deus e, em pouco tempo, uma de suas cartas, revela a grande consolação que sente no trato com os enfermos. “Pouquíssimos doentes saem do hospital sem se confessar e comungar. Temos tido a felicidade de ver morrer com sentimentos admiráveis de piedade um certo número de mulheres, especialmente quatro jovens. Era admirável escutá-las: não falavam senão do céu, não suspiravam senão pelo céu. Uma delas queria que a levássemos à capela, apesar do seu estado, para assistir mais uma vez à missa. Uma outra, pouco antes da morte, chamou-me: “Madre, quero receber ainda uma vez o meu Deus para levá-lo comigo.” O capelão, que estava presente, lhe diz, apresentando-lhe um crucifixo: “Beija o teu Deus” ao que a pobre responde: “o senhor me apresenta o seu retrato, mas eu o quero em pessoa.””
Tais cenas edificantes comovem as Irmãs e dão-lhe novo alento para enfrentar as mil e uma dificuldades, com que as presenteia o Divino Esposo, na ânsia de aperfeiçoá-las, para melhor premiá-las. Elas não se lamentam, sentem-se felizes quando veem voltar para Deus os doentes que curavam.
Assim transcorre a vida na Santa Casa campineira. Quando menos se espera trazem um ferido, um moribundo, um escravo desordeiro, e imediatamente deixa-se tudo par a socorrer o necessitado. Num hospital não se pode contar com tranquilidade.