14 de Junho de 1924
Tempo quente em Cabreuva
Apezar do grande frio que tem feito, sábado ultimo houve aqui um tempo quente, que causou não pequeno sobressalto em toda esta pacifica população.
Foi o caso que durante a audiência do Juiz de Paz, na qual se debatia a importante questão de um porco morto a chumbo em roça alheia, alguns dos curiosos presentes puzeram-se a discutir sobre o despacho dado pelo juiz, dizendo uns que o despacho devia ser assim, e sustentando outros que devia ser assado. A discussão acalorou-se, dando em resultado um frége que poz a audiencia em polvorosa. O Juiz, vendo o perigo, achou mais prudente raspar-se, e dar a audiência por encerrada, no que foi imitado pelo pessoal do fôro, e muitos dos circumstantes, que se puzeram em debandada.
O sorilho foi energicamente reprovado pelos advogados de ambas as partes litigantes, entendendo que o ponto em debate devia ser resolvido de acôrdo com a lei, e não assim, a muque, e entre pessoas que nada tinham que ver com o peixe da demanda.
E eis ahi como por causa de um porco se fez tanto barulho! Bem se diz que, muitas vezes, uma faísca produz um incendio. Essa questiuncula de um porco, que foi morto em roça alheia num dos bairros deste município, está revolucionando não só aquelle bairro como até esta cidade, em que já se formaram dois partidos – um a favor do que matou o porco, dizendo esses que a lei de porco que sae em roça alheia é chumbo grosso, e sustentando outros que, quem mata porco alheio, ainda que seja em sua roça, deve pagar ao dono o seu valor.
E como em medicina todo o mundo é médico, assim em questões forenses todo o mundo quer ser advogado, dando a sua opinião, ainda que das mais disparatadas.
Mas voltando ao caso do porco, vamos ver qual será a sentença do Juiz de Paz, se elle decide que a lei sobre o porco que entra em roça alheia é mesmo ou não é chumbo. O nosso publico está ancioso por essa sentença.
Do correspondente.
Pesquisa – Biblioteca Histórica
“Padre Luiz D’Elboux” (Igreja do Bom Jesus), respeitada a ortografia original.