Pentecostes e a Sabedoria  do Coração
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Amados irmãos e irmãs, aproximamo-nos da Festa do derramamento do Espírito Santo. Todos os anos, a Igreja, durante o tempo pascal, fortalece seu caminho de unidade, através de uma grande catequese. O tempo da ressurreição já é a preparação para o Pentecostes. Trata-se de um renovado convite que Deus nos faz para estabelecermos relações mais sólidas, marcadas pela vivência dos dons e carismas concedidos pelo Senhor através do seu Sopro de Vida.
Gostaria de refletir sobre um dos sete dons do Espírito, a Sabedoria, evocada pelo Papa Francisco como tema para o 58º Dia Mundial das Comunicações Sociais. Em tempos de realidade virtual e de inteligência artificial, somos chamados a não abandonar nossa humanidade a uma mera operacionalidade técnica, mas evocar nossos laços e sentimentos mais profundos na construção de comunidades reais, encarnadas e transformadas pelos afetos, jamais reduzidas à lógica dos algoritmos.
Na mensagem para o Dia das Comunicações Sociais deste ano, o Papa Francisco alerta para os riscos iminentes que as inovações tecnológicas, sobretudo aquelas trazidas pela inteligência virtual e os mecanismos algorítmicos das redes sociais trouxeram para nossa humanidade. A técnica pode criar um ambiente hostil que favorece a divisão e fragiliza nossas relações. De acordo com o Papa, a propagação em larga escala de notícias falsas pode criar uma “poluição cognitiva” que desemboca em um “pântano anônimo” onde a verdade é comprometida pelos interesses de mercado ou de poder. A substituição do rosto pela tela iluminada, e a do encontro afetivo pela virtualidade podem limitar nossa humanidade a uma mera codificação, reduzida aos objetivos das plataformas e suas demandas. Nesse sentido, a técnica, que poderia servir para a difusão da verdade e para aproximar as pessoas, na direção de uma comunicação onde todos se entendem, se transforma em um lugar de confusão. Ao invés de sabedoria, ignorância. Ao invés de Pentecostes, Babel, onde todos falam ao mesmo tempo, mas ninguém escuta.
Contra a tentação do fascínio tecnológico, somos chamados a agir com Sabedoria. Não aquela que se reduz a uma mera operação da razão, quantificada em conhecimento. Trata-se de evocar a Sabedoria que vem do coração. O Papa cita o filósofo italiano Romano Guardini, que, refletindo sobre a técnica e o homem, convidava a não se inveterar contra o “novo” na tentativa de “conservar um mundo belo condenado a desaparecer”. “O nosso posto é no dever. Devemos inserir-nos nele, cada um no seu lugar, aderindo honestamente, mas permanecendo sensíveis, com um coração incorruptível, a tudo o que nele houver de destrutivo e não-humano”. De acordo com Guardini, contra os riscos das novas tecnologias, “deve-se formar um novo tipo humano, dotado de uma espiritualidade mais profunda, uma nova liberdade e uma nova interioridade”.
A Sabedoria, dom do Espírito, fortalece essa sensibilidade para que o humano não seja subsumido na técnica. Mais do que isso, oferece caminhos de discernimento para não reduzirmos as relações humanas às virtuais. Impregnar as novas tecnologias com o Espírito de Pentecostes significa prezar pela busca da verdade e por sua defesa incansável também nos ambientes digitais de nossas comunidades. Não reduzir o anúncio do Reino feito nas plataformas e redes sociais a uma mera expectativa algorítmica, que formata e molda os conteúdos ao sabor das demandas, interesses e likes do momento. A Sabedoria do Espírito há de nos conduzir por caminhos de unidade e de respeito, fortalecendo iniciativas de encontro e jamais de divisão entre nós. Destaco aqui a importância de Pastorais da Comunicação bem preparadas, formadas para evangelizar, espalhando o perfume de Pentecostes com a alegria que o Espírito faz brotar dos nossos corações.
No Espírito de Pentecostes, o Papa evoca a Sabedoria que brota do Coração. “Ela se deixa encontrar por quem a busca e se ver por quem a ama” (cf. Sab 6,12). “Sem esta sabedoria, a existência torna-se insípida, pois é precisamente a sabedoria que dá gosto à vida”. O mundo virtual que se apresenta inevitável para nós pode nos aproximar ou nos afastar uns dos outros. A vida em comunidade não pode se reduzir a um seguimento solitário de pregadores ou páginas isoladas nas redes sociais. Esses canais têm a sua importância e podem oferecer um precioso alimento espiritual, sobretudo para quem não pode, por motivos de saúde, participar efetivamente da vida paroquial. Todavia, a vida humana é feita para o encontro. O afeto é um dos caminhos pelos quais a Sabedoria do coração se realiza. Estejamos atentos para que a realidade virtual não enfraqueça em nós o gosto de estar juntos, de rir juntos, chorar juntos e convivermos como pessoas encarnadas e reais.
A Sabedoria nos conduz à unidade. Unidade que se traduz em escuta e encontro, partilha e testemunho, diversidade e esperança. Caminhamos juntos para um novo tempo em que a tecnologia pode servir à nossa humanização ou à nossa destruição. À espera de Pentecostes, somos chamados a escutar mais o nosso coração, onde Deus nos fala com Sabedoria. Ali, Ele se comunica! Onde os códigos e os algoritmos não nos alcançam, onde as imagens e os sons são desnecessários, onde não somos um “perfil”, mas temos um nome! Ali, nenhuma palavra é necessária e nunca a comunicação é tão profunda!
Que a Sabedoria nos encontre e no silêncio de nossa intimidade, proclame para nossas vidas que o Espírito Santo habita os nossos corações.

O Pentecostes é Real!

 

Dom Arnaldo Carvalheiro Neto 

Bispo Diocesano de Jundiaí