São Geraldo Magella,  um colosso mineiro
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por Altair José Estrada Junior

Morar longe da cidade natal, se por um lado nos faz sentir saudade das celebrações e festividades com as quais estávamos acostumados e tanto nos envolviam, possibilita-nos conhecer tradições e devoções que jamais imaginávamos existir com tamanha força.
Foi assim quando moramos por quase seis anos na cidade de Registro, no Vale do Ribeira, sul do Estado de São Paulo. Há uma hora dali estava Iguape, já no litoral, com a segunda maior festa religiosa do estado: a do Bom Jesus de Iguape. A festa de Iguape atraía centenas de milhares de romeiros e fiéis devotos todos os anos no mês de agosto à histórica cidade, buscando agradecer e pedir graças ao Bom Jesus da Cana Verde, representado pela milagrosa imagem exposta no alto do altar-mor de sua linda basílica.
Agora morando com a família no interior de Minas Gerais, mais precisamente no centro geográfico do estado, gratíssima foi nossa surpresa ao nos depararmos com aquela que sem dúvida é uma das maiores festas religiosas de Minas Gerais, a de São Geraldo Magella. Com aproximadamente 80 mil habitantes, a cidade de Curvelo abriga a também linda e artística basílica do santo, a única no mundo localizada fora da Itália, sua terra natal. Numa mistura de estilos neorromânico e nórdico, e dirigida pelos padres redentoristas, que ali também mantém um convento de sua congregação, a Basílica Menor de São Geraldo Magella promove nos meses de agosto/setembro a chamada “Oitava de São Geraldo”, com oito dias de preparação para a grande festa que acontece num domingo, com sucessivas missas e concorrida procissão. Já em outubro, quando se celebra a festa litúrgica do santo no dia 16, acontece um tríduo também festivo e, no domingo, outra procissão.
São Geraldo Magela foi o primeiro santo canonizado da Congregação do Santíssimo Redentor, dos chamados missionários redentoristas. Nascido em 1726 na cidade italiana de Muro Lucano e falecido em 1755 em Caposele, São Geraldo foi um irmão leigo dotado de extraordinária virtude. Após a morte do pai, que era alfaiate, para suprir a necessidade da família pobre assumiu o mesmo ofício. Tentou ingressar na Ordem dos Capuchinhos, sendo recusado em razão da saúde debilitada. Mais tarde foi aceito pelos redentoristas, onde serviu como sacristão, jardineiro, porteiro, enfermeiro e alfaiate. Ao fugir de casa para o seminário, deixou um bilhete à mãe: “Mãe, me perdoe, eu vou me tornar um santo”. Seu lema, que repetia inúmeras vezes, era “Aqui se faz a vontade de Deus, como Ele quiser e até quando Ele quiser”. A grande provação sofrida em 1754, quando acusado falsamente de ser o pai do filho de uma mulher grávida que depois se arrependeu e se retratou, situação que enfrentou em silêncio, sem se defender e confiante na vontade de Deus, fez dele o patrono da gravidez, muito invocado por mulheres que esperam por um filho. São Geraldo morreu de tuberculose aos 29 anos e foi beatificado por Leão XIII em 1893 e canonizado por São Pio X em 1904.
A Oitava de São Geraldo, realizada em agosto/setembro para evitar as chuvas praticamente certas em outubro, é algo espantoso. Durante oito dias concorridas missas são realizadas no interior da basílica e na praça ao lado, onde edificado um altar para as celebrações e acolhimento dos fiéis. No domingo da festa, verdadeira multidão de romeiros invade a cidade que se alegra não somente pelos eventos religiosos, toques de sinos e espoucar de rojões, mas também pela quermesse da basílica e pelas centenas de barracas montadas nas suas proximidades, a venderem de quase tudo: comes e bebes, objetos devocionais, roupas, utensílios para cozinha, brinquedos, eletrônicos e o que mais se possa imaginar. São ônibus e mais ônibus vindos de todas as partes do estado e de outros também, como é o caso de uma romaria de Belém do Pará, distante mais de 2.600 quilômetros de Curvelo e, pelo que se disse, presente anualmente à festa. O Tríduo de outubro é mais modesto, mas também muito concorrido.
Como membro da Liga Católica Jesus, Maria, José da basílica, ajudei por um período na organização e orientação da chamada “fila do beijo”, que a partir das três horas da madrugada do domingo passou a desfilar ininterruptamente diante da imagem milagrosa de São Geraldo em sua urna mortuária até o início da noite daquele dia, quando terminou a monumental procissão. A habitualidade com demonstrações de fé não evitou que me impressionasse com a devoção daquele povo simples e humilde, vindo de longe, muitos vestindo o hábito redentorista como seu padroeiro. Quantos e quantos, com lágrimas nos olhos, vivamente emocionados, apoiavam a mão naquele vidro, às vezes a testa, e de olhos fechados agradeciam e colocavam nas mãos de seu protetor as suas vidas, suas famílias, seus trabalhos, suas dificuldades, suas alegrias e tristezas.
Confesso que conhecia São Geraldo Magella mas não tinha a menor noção do quando o povo deste país lhe é devoto, em especial o mineiro. Que São Geraldo continue abençoando e protegendo nosso Brasil e essa gente boa que tanta confiança nele deposita.