Os ministérios na Igreja, o Papa inicia um diálogo com os bispos
A mensagem de Francisco para o aniversário do motu proprio “Ministeria quaedam” de Paulo VI: útil uma partilha com as conferências episcopais do mundo sobre as experiências desses anos para prosseguir no caminho sem forçá-lo com escolhas “que são o fruto de visões ideológicas”.
Cinquenta anos se passaram desde o motu proprio de Paulo VI “Ministeria quaedam” que reformou as ordens menores e instituiu os ministérios laicais. O Papa Francisco celebra a ocasião com uma mensagem assinada em 15 de agosto, divulgada nesta quarta-feira (24/08), e anuncia que quer iniciar um diálogo com as conferências episcopais de todo o mundo “a fim de compartilhar a riqueza das experiências ministeriais que nesses cinquenta anos a Igreja viveu tanto como ministérios instituídos (leitores, acólitos e, só recentemente, catequistas) quanto como ministérios extraordinários e de fato”. O objetivo, explica o Pontífice em sua mensagem, é “o de ouvir a voz do Espírito e não deter o processo, tendo cuidado para não querer forçá-lo impondo escolhas que são o fruto de visões ideológicas”. Por isso, Francisco acredita que “é útil partilhar, ainda mais, no clima do caminho sinodal, as experiências desses anos. Elas podem oferecer indicações valiosas para chegar a uma visão harmoniosa da questão dos ministérios batismais e, assim, prosseguir em nosso caminho”.
O caminho do Papa Montini e as Cartas de Francisco
Francisco na mensagem lembra que o motu proprio de Paulo VI não só renovou a disciplina das ordens menores e do subdiaconato, “mas ofereceu à Igreja uma perspectiva importante que teve a força de inspirar novos desenvolvimentos”. Sobre a possibilidade de desenvolver novos ministérios foi falado durante o Sínodo sobre a Amazônia. A seguir, o Papa Francisco intervém sobre o assunto com duas Cartas Apostólicas: a primeira, “Spiritus Domini”, de 10 de janeiro de 2021, que abriu o acesso de pessoas do sexo feminino ao ministério instituído de Leitorado e Acolitado. A segunda, “Antiquum ministerium”, de 10 de maio de 2021, instituiu o ministério de Catequista. “Essas duas intervenções”, explica o Papa, “não devem ser interpretadas como uma superação da doutrina anterior, mas como um desenvolvimento a mais que se tornou possível porque se fundamenta nos mesmos princípios, coerentes com a reflexão do Concílio Vaticano II” que inspirou Paulo VI. O Papa Montini, aceitando os pedidos de “não poucos” Padres conciliares, cinquenta anos atrás “reconheceu às Conferências Episcopais a possibilidade de pedir à Sé Apostólica a instituição desses ministérios considerados necessários ou muito úteis em suas regiões. Até mesmo a oração de ordenação do bispo, na parte das intercessões, indica entre suas principais tarefas, a de organizar ministérios”.
Fundações de cada ministério
Francisco explica que “o tema é de fundamental importância para a vida da Igreja: na verdade, não existe comunidade cristã que não expresse ministérios”, como mostram as Cartas de São Paulo, onde “é descrita uma ministerialidade generalizada, organizada com base em dois fundamentos certos: na origem de cada ministério há sempre Deus que com seu Espírito Santo trabalha tudo em todos” e “a finalidade de cada ministério é sempre o bem comum, a construção da comunidade”. Todo ministério é, portanto, “um chamado de Deus para o bem da comunidade”. Graças a esses dois fundamentos, a comunidade cristã pode organizar “a variedade de ministérios que o Espírito desperta em relação à situação concreta em que vive”. Esta organização, escreve o Papa, “não é um fato meramente funcional, mas um discernimento comunitário atento, na escuta do que o Espírito sugere à Igreja, num lugar concreto e no momento atual de sua vida”. Assim, “toda estrutura ministerial que nasce desse discernimento é dinâmica, vivaz, flexível como a ação do Espírito: nela deve arraigar-se mais profundamente para não correr o risco de que o dinamismo se torne confusão, a vivacidade se reduza à improvisação extemporânea, a flexibilidade se transforme em adaptações arbitrárias e ideológicas”.
Realidade superior à ideia
Francisco na mensagem lembra que “a eclesiologia de comunhão, a sacramentalidade da Igreja, a complementaridade do sacerdócio comum e o sacerdócio ministerial, a visibilidade litúrgica de cada ministério são os princípios doutrinais que, animados pela ação do Espírito, tornam a variedade de ministérios harmoniosa”. A questão dos ministérios batizados aborda diversos aspectos que “certamente devem ser considerados: a terminologia usada para indicar os ministérios, sua fundação doutrinal, os aspectos jurídicos, as distinções e relações entre os ministérios individuais, o seu valor vocacional, os percursos de formação, o evento principal que possibilita o exercício de um ministério, a dimensão litúrgica de cada ministério”. Questões evidentemente complexas, que, “certamente é necessário continuar aprofundando”, afirma o Papa, mas sem “pretender defini-las e resolvê-las para então viver a ministerialidade”, porque agindo dessa forma “muito provavelmente não conseguiremos caminhar muito”. É por isso que na mensagem Francisco repete o que já foi escrito na Exortação “Evangelii gaudium”, ou seja, que “a realidade é superior à ideia” e “é preciso estabelecer um diálogo constante entre as duas, evitando que a ideia acabe se separando da realidade”. Além disso, o Papa lembra que “o tempo é superior ao espaço”. Portanto, “mais do que a obsessão de resultados imediatos em resolver todas as tensões e esclarecer todos os aspectos, correndo o risco de cristalizar os processos e, às vezes, pretender pará-los, devemos apoiar a ação do Espírito do Senhor”.