Creio na Vida Eterna XXI
Paraíso e experiência terrena
por Pe. Daniel Bevilacqua Santos Romano.
Vigário na Paróquia Nossa Senhora do
Monte Serrat – Salto/SP
“Os dogmas da ressurreição do corpo e da comunhão dos santos, entendidos no contexto da antropologia bíblica que vê o homem como ser multi-relacional (relação com Deus, com os irmãos e com o cosmo) e da ligação indissolúvel entre criação e salvação, levem-nos a ultrapassar a concepção de um paraíso completamente desligado da história e da vivência terrena do homem, vivência à qual estaria apenas ligado pelo cordão umbilical do mérito nela adquirido através das boas obras.
Na perspectiva bíblica, a vida eterna é o cumprimento da vivência terrena marcada pela criação e pela graça. Trata-se da vida na sua máxima concentração, que podemos ter experimentado de modo germinal em alguma experiência gratificante. De fato, o paraíso começa já ali onde a graça encontra a sua expressão na história. Como observa São João, quem acredita, quem está no amor, já tem a vida eterna.
Do mesmo modo, quando o homem se fecha no próprio egoísmo, começa a sua autodestruição, o seu inferno. Tanto o inferno como o paraíso são, por assim dizer, a lógica imanente da vida humana. Semelhante ponto de vista constata-se sobretudo na escatologia presente de João: a realidade última já é de certo modo antecipada no hoje histórico, já está presente, embora de modo imperfeito. Quem acredita, quem está no amor, já tem a vida eterna; quem não acredita e não ama, já está na morte. Paraíso e inferno vão-se formando, assim, desde já, na nossa vida. A vida eterna não ocupa o lugar da vida terrena, mas já começa nela. Não é um substituto da vida atual. Mas o seu cumprimento.
Nesta perspectiva, não é difícil inserir toda a dinâmica da esperança que rege a vida humana, projetando-se na utopia e na ação histórica.
Dimensão social e cósmica da bem-aventurança
Pouco podemos dizer da dimensão cósmica da bem-aventurança (visto tratar-se de um aspecto completamente esquecido pela teologia do passado). De qualquer modo, é certo que o homem não pode encontrar a sua plena realização sem a relação com o mundo. O mundo, com efeito, não é apenas uma infraestrutura ou um suporte transitório da existência humana (isto é platonismo e não cristianismo). Na visão bíblica, o mundo é, pelo contrário, o ambiente conatural à sua corporeidade, o espaço aberto à sua criatividade. A revelação fala não só de ressurreição do corpo, mas também, em ligação direta, de uma nova criação em que o homem ressuscitado na sua integridade, também corpórea, viverá a sua realização definitiva.”
Concluiremos na próxima edição…