Espiritualidade e participação nos movimentos sociais atuais
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por Olga Sodré

Profetas de ontem e de hoje

A insensibilidade diante do sofrimento humano aumenta a dicotomia entre a vida espiritual e a vida social. Está ocorrendo, entretanto, uma reação positiva de movimentos sociais, em particular entre os mais jovens, que protestam em defesa do meio ambiente, da democracia, contra a violência e as injustiças sociais. Em documento entregue recentemente pelo Arcebispo de Manaus, Dom Leonardo Ulrich Steiner, à Procuradora-geral de Justiça do Amazonas, por exemplo, movimentos sociais daquele estado se manifestaram contra a violência e práticas não autorizadas, em área indígena.
Ao aprofundar os ensinamentos de Cristo, pude integrar as descobertas de minha caminhada social ao enriquecimento trazido pelo diálogo com Deus. Está cada vez mais claro para mim a importância de um movimento constante e coletivo de transformação humana para a realização do projeto de novos céus e de uma nova terra. Por isso acompanho os acontecimentos atuais do ponto de vista da unidade do universo em Cristo, Senhor da História, procurando seguir a tradição dos profetas que sempre mantiveram um diálogo com Deus e com o povo.
O profeta Amós, por exemplo, anunciava que Deus rugia de Sião (Am1,2). Esse profeta dizia que Deus denunciava as estruturas do culto religioso que permaneciam indiferentes à realidade: “Longe de mim o barulho de seus cânticos. Nem quero ouvir a música de suas liras. Eu quero, isto sim, é ver brotar o direito como água e correr a justiça como torrente que não seca”, dizia Deus a Amós (Am 5,23-24). Frei Adriano de Lima comentando esse profeta observa que os atuais profetas precisam anunciar que Deus continua a rugir, embora não seja ouvido pela maioria (https://itf.edu.br/publicacoes/artigos-exibe/130144852/).
Existem diferentes caminhos de espiritualidade e diversas formas de denúncia das injustiças, que correspondem a dons diversos. Embora reconhecendo a centralidade de Cristo no Cosmos e seu papel em nossa História e na vinda do Reino de Deus, acho que não me cabe julgar nem desprezar nenhuma dessas contribuições nem nenhum tipo de espiritualidade ou ação social nessa direção. Assim sedo, procuro dar meu testemunho em união com os que contribuem de uma forma ou de outra para mudar essa dolorosa situação humana, no respeito e amor pelo meu próximo e por nossa caminhada conjunta rumo a um novo mundo.
Saúdo com imensa alegria os primeiros vestígios da nova primavera que desponta atualmente. Mesmo levando uma vida contemplativa, não estou alheia ao que se passa no mundo, e meu diálogo com Deus inclui os acontecimentos sociais e políticos. O retorno ao catolicismo colocou o diálogo com Deus no coração da minha vida, e é a partir da escuta de sua Palavra que eu participo dos acontecimentos e relato minhas experiências. Ocorreu, desse modo, uma integração entre meu caminho interior e minha caminhada no mundo social. A escuta da Palavra de Deus se tornou uma fonte de grande aprendizagem, suporte e deleite. Minha vida espiritual não me separou, portanto, da participação na História, que para os católicos encontra seu sentido último no Deus que nela entrou e que nela continua a caminhar conosco.

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