A raiz dos desequilíbrios sociais
por Olga Sodré
Crise da democracia e da civilização: rumo à barbárie e à destruição da humanidade?
Apesar das limitações do jogo eleitoral do qual participaremos em breve, ele nos abre um espaço de discussão em torno dos graves problemas que o país atravessa. Desde o final de 2019, venho alertando sobre a crise da civilização e da democracia e sua relação com o avanço da barbárie. Esta vem se alastrando em nosso país. A violência cresce assustadoramente e se manifesta na fome, miséria e assassinato brutal de pessoas e até crianças. A destruição atinge várias áreas da vida social: saúde, educação, meio ambiente, cultura e relações sociais. Ela se alimenta da ganância, ódio, mentiras e injustiças sociais.
É interessante refletir sobre estas questões a partir do profeta bíblico Amós, pois o que ele anunciou (em 750 A. C.) aplica-se ao que se observa atualmente no Brasil. Isso não significa não terem ocorrido avanços na História humana, mas indica que Amós tocou no cerne de um problema ainda por resolver. Daí a importância de analisarmos a raiz dos desequilíbrios sociais por ele revelada. Ele é considerado o ‘profeta da justiça’, pois a aborda socialmente e descreve seus princípios gerais.
Amós denuncia a multiplicação das injustiças sociais, corrupção, abundância e luxo dos ricos à custa da opressão dos pobres e indefesos. Ele critica a religião corrupta que segue o ritual prescrito, mas aceita tais opressões e injustiças, apontadas como um ‘pecado social’ das elites que levam uma vida de excessos com base na exploração e em práticas comerciais ilícitas e enganadoras. Amós acusa não só a indiferença e o orgulho dos ricos em relação aos necessitados, indefesos e marginalizados, mas a ambição de alguns poderosos que destroem as instituições livres feitas para todos.
O profeta se opõe claramente contra uma ordem social injusta que abusa da condição da população empobrecida. Considera essa realidade absurda e sustentada pela corrupção moral, pela vida devassa de elites arrogantes e pela hipocrisia de uma religião formal, descomprometida com o direito e a justiça. A importância atual desta profecia reside na descrição dos problemas sociais, na perspectiva de uma sociedade mais justa de acordo com a palavra de Deus.
A prática da injustiça social é entendida como contrária a Deus. Ela é uma decadência social que decorre da concentração das riquezas nas mãos de poucos e da alienação sócio-política manipulada pelos interesses econômicos dominantes. A voz de Amós ressoa até hoje e nos anuncia o Deus da vida que opera na História e a quer transformada. A proposta por ele apresentada e que devemos renovar é a de um novo humanismo: um convite para nos transformarmos, tornarmos o mundo menos desumano, mais civilizado e de acordo com a vontade divina.
Cabe-nos contribuir para a construção de uma sociedade edificada sobre a justiça social. Com esse objetivo, nossa participação política nas próximas eleições brasileiras pode vir a ser um passo adiante na desinstalação das estruturas que desumanizam, na superação dos sistemas de opressão e morte, abrindo caminho para alcançarmos um outro modo de vida numa sociedade renovada de acordo com a proposta de Deus.