A dança da vida e da morte: experiências do limiar da morte
por Olga Sodré
Entrelaçamento das duas forças no palco do mundo
Meu amor pela dança levou-me a perceber a relação da vida e da morte como uma forma de dança. Entrelaçadas no palco do mundo, essas duas forças deslizam de rostos colados ao ritmo da luz que acende e apaga. Enredados nessa dança, os seres humanos não estão atentos à pulsação constante da chama vital luzindo até extinguir-se repentinamente.
O caminho espiritual colocou-me em contato com o mistério que impulsiona tal dança. Radiante com minha descoberta, decidi compartilhá-la e contar como cheguei até ela. A vida é uma incógnita, mas – encarando apenas seu lado natural – nem sempre reconhecemos sua estranheza. As ciências pesquisam a dimensão material desse processo, mas não alcançam o mistério que o sustenta. No entanto, nada mais estranho do que sermos lançados neste mundo e sermos dele retirados pela morte!
Este mistério permanece como o oculto pano de fundo dos acontecimentos humanos. Focalizando o desenrolar deles, acabamos enredados pelo seu fluxo, ações e personagens, sem perceber a dança da vida e da morte. Embora a limitação da mente humana só permita nos aproximarmos dessa dança subjacente pela narração simbólica, talvez o relato de experiências do limiar da morte possa nos colocar em contato com tal dança.
Vivi intensamente minha juventude até que a morte entrou em cena, conduzida pela trágica perda de entes queridos. Nessa ferida aberta, introduziu-se a depressão, levando-me a descobrir a presença da morte dentro de mim. Um dia em que estava sozinha, deitada em minha cama, a força de morte se apossou do meu corpo e me dominou. Perdi consciência de mim mesma e meus pés me conduziram inconscientemente até a janela. Quando meu corpo ia ser lançado para fora, alguém bateu na porta, e recobrei a consciência. O tratamento psicológico permitiu-me superar esta experiência e transformar este conhecimento num caminho de realização afetiva, intelectual e profissional. Anos depois, o surgimento de uma grave doença reafirmou a presença constante da morte. A consciência dessa possibilidade confrontou-me novamente com a ameaça de extinção da vida. Face ao medo da aniquilação, percebi que meu corpo se agarrava ao plano físico.
Impotente diante deste novo desafio, respeitei o medo natural da morte, procurando com ele conviver. Desejava a vida eterna, meu espírito sentia-se livre para voar mais alto, porém meu corpo insistia em manter a forma de vida que conhecia. Renunciando a qualquer pretensão de força ou saber diante da morte, aceitei minha fraqueza e vulnerabilidade.
A dança da vida e da morte escapa ao controle de nossas limitadas mãos humanas: nada podemos diante da iminência da morte certa. Não havendo como governar essa dança, conclui ser mais sábio observar seu espetáculo com lucidez, usufruindo a beleza de seus passos e com eles ir aprendendo a viver e morrer.
Ao aceitar essa limitação humana, encontrei algo muito maior, que transcende nossa compreensão e descortina um horizonte totalmente novo. As experiências do limiar da morte me ensinaram a confiar no mistério. Entregando-me ao ritmo da dança, percebi estar dançando com Cristo, enlaçada por sua presença amorosa.