A teologia da Cruz
Dom Fernando Arêas Rifan
Administração Apostólica Pessoal São João Maria
No dia 14 de setembro, a Igreja celebrou a festa da Exaltação da Santa Cruz. Esta festa, muito antiga, também chamada de Cruz gloriosa, celebrava-se já em Jerusalém no tempo de Constantino (337).
A cruz que se exaltava era menos a de Jesus a sofrer no Calvário que a de Cristo glorioso subindo para o Pai, depois de vencer a morte e salvar o mundo. Recorda-se, portanto, o triunfo de Cristo e a mudança por ele causada na condição humana, como ele mesmo anunciara: “Eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a mim” (Jo 12,32).
Esta festa passou de Jerusalém a todo o Oriente e, depois, ao Ocidente, coincidindo com a apresentação solene da verdadeira cruz do Salvador. E no dia 15 próximo, celebramos a memória de Nossa Senhora das Dores, a mãe de Jesus, presente no Calvário, na crucifixão e morte do seu filho.
É uma boa ocasião para falarmos da cruz presente em nossas vidas. Fala-se hoje em muitas teologias: teologia da prosperidade, teologia da libertação, mas a mais importante é a teologia da Cruz. Ali está a verdadeira ciência do cristianismo. São João Paulo II, falando das curas dos doentes em Lourdes, pela intercessão de Nossa Senhora, explica: “O Espírito Santo, que a encobriu com a sua sombra no momento da Encarnação do Verbo, transforma a alma de numerosos doentes que a ela recorrem. Mesmo quando não obtêm o dom da saúde corporal, podem sempre receber outro muito mais importante: a conversão do coração, fonte de paz e de alegria interior. Este dom transforma a sua existência e faz deles apóstolos da cruz de Cristo, estandarte de esperança, mesmo entre as provas ais duras e difíceis”.
“Na Carta apostólica Salvifici doloris eu anotava que o sofrimento pertence à vicissitude histórica do homem, o qual deve aprender a aceitá-la e a superá-la. Mas como pode ele aceitar isto, senão graças à cruz de Cristo? Na morte e ressurreição do Redentor, o sofrimento humano encontra o seu significado mais profundo e o seu valor salvífico.
Todo o peso de tribulações e sofrimentos da humanidade está condensado no mistério de um Deus que, assumindo a nossa natureza humana, se anulou até se fazer ‘pecado em nosso favor’ (2 Cor 5, 21). No Gólgota Ele carregou as culpas de todas as criaturas humanas e, na solidão do abandono, gritou ao Pai: ‘Por que Me abandonaste?’ (Mt 27, 46). Do paradoxo da Cruz surge a resposta às nossas interrogações mais inquietantes. Cristo sofre por nós: Ele assume sobre si os sofrimentos de todos e redime-os. Cristo sofre conosco, dando-nos a possibilidade de partilhar com Ele os nossos sofrimentos.
Juntamente com o de Cristo, o sofrimento humano torna-se meio de salvação. Eis por que o crente pode dizer com São Paulo: “Agora alegro-me nos sofrimentos que suporto por vós e completo na minha carne o que falta às tribulações de Cristo, pelo seu Corpo, que é a Igreja” (Cl 1, 24). O sofrimento, aceite com fé, torna-se a porta para entrar no mistério do sofrimento redentor do Senhor. Um sofrimento que já não priva da paz e da felicidade, porque é iluminada pelo esplendor da ressurreição.”