Carmen Selma Santoro
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Há mais de trinta anos estudo a história da música de Itu. É certo que já li sobre diversos intérpretes que viveram aqui, tocaram, cantaram, regeram e compuseram, inclusive. Mas não vi, no meu tempo de vida, um músico completo com a Selma Santoro.

Selma foi a melhor representante de uma geração de jovens músicos que teve o privilégio de estudar no Conservatório Maestro Elias Lobo, onde iniciei a formação, mantido pela profa. Marisa Ferretti. Ali se reuniam professores-concertistas, mestres que só vieram, porém lapidar o talento da menina, já educada no ambiente de casa.

Filha de Manolo, flautista e d. Carminha, cantora no Coro do Carmo, Selma herdou a musicalidade de ambos, cultivada cotidianamente no espaço doméstico de tanta oportunidade. Manolo e Selma faziam dueto instrumental e a mãe, vez por outra, cantava belas melodias da tradição brasileira. Tocava também castanhola e flauta e com este instrumento foi a primeira mulher a tomar parte na Corporação Musical União dos Artistas em seus tempos áureos.

Com a decadência do Coro do Carmo, vítima da errônea interpretação local sobre as decisões do Concílio Vaticano II, Selma idealizou um coro para manter vivo o canto coral em Itu. Procurou o Frei Lino Zumstein, arregimentou gente próxima e assim nasceu o Coral Vozes de Itu a 7 de maio de 1965. Foi a primeira pianista, arranjadora e ensaiadora do grupo. Ficou pouco tempo, porém. Na celebração do cinquentenário do Coral, ela voltou a frequentá-lo novamente.

Formada em Letras, Carmen Selma lecionou inglês por muitos anos na Escola Estadual Dr. Cesário Mota, onde foi minha professora. Mas eu já a conhecia de casa, dos aniversários animados das minhas tias, quando ela e o Manolo conduziam a cantoria que privilegiava a música popular brasileira.

Quando meu pai faleceu, ela se tornou organista no Bom Jesus, tocando o harmonium nas celebrações, principalmente na Semana Santa. A sua melhor execução, porém, era no órgão de tubos da igreja matriz, o Cavaillé-Coll que ela dominava tocando com as mãos e os pés. Acompanhava o Coro da Matriz, ressurgido em 1978 pelas mãos da regente Ruth de Arruda Castro. Não eram mais as belas e velhas músicas da Igreja. O repertório sem graça foi criado para que o povo cantasse junto. Selma cuidava de melhorar um pouco as sofríveis melodias com uma harmonização bonita.

Vez por outra, a regente escapava das regras impostas pela comissão paroquial de liturgia, colocava uma peça antiga e mais bonita; então a Selma podia dar vazão ao seu notável talento musical. Lembro-me de uma festa de Nossa Senhora do Carmo realizada na matriz. Ela cantou a jaculatória antiga, ao mesmo tempo que acompanhava. A sua voz clara, tão bonita e parecida com a de sua mãe, ecoou glorioso na igreja. Havia um pequeno e encantador vibrato em seu timbre de soprano que potencializava os harmônicos e a afinação.

Só quem a ouviu interpretar o Canto da Verônica, por tantos anos, conheceu um tempo de ouro na música de Itu.

Gratidão!