Fraternidade sem fronteiras
Cardeal Sergio da Rocha
Arcebispo de Salvador (BA)
Num mundo marcado por tantas situações de exclusão, de intolerância e de outras muitas formas de violência, corre-se o risco de pensar que não seja mais possível a fraternidade, o respeito e a paz. É um grande desafio, de fato, a convivência fraterna, respeitosa e pacífica, na família, no trabalho e nas redes sociais, dentre outros ambientes.
Contudo, o anseio de paz permanece no coração das pessoas, teima em resistir como um traço genuinamente humano, sinal do Criador, que nos permite olhar para o horizonte com esperança, sem jamais desistir de caminhar na construção de um mundo novo. Embora seja forte a tendência em se difundir o que não é bom, é preciso reconhecer e valorizar os inúmeros gestos de amor e de solidariedade que acontecem no dia a dia, ainda que possam parecer pequenos ou insuficientes. Basta abrir os olhos e o coração e certamente veremos ao nosso redor muitos sinais de esperança que animam a seguir em frente no caminho da fraternidade.
A consciência da gravidade dos problemas sociais ou pessoais e da complexidade da realidade não devem levar ao desânimo, à perda dos ideais, nem à cômoda passividade. Enquanto vivemos, sempre podemos ser melhores, crescer e amadurecer como pessoas humanas e contribuir para que os ambientes onde vivemos sejam mais fraternos.
Entretanto, embora sejam sempre necessárias as iniciativas espontâneas de cada um, há problemas e situações que exigem ações comunitárias e projetos de cunho sociopolítico. Os partidos políticos, as organizações da sociedade civil, as Igrejas e as diversas confissões religiosas, podem contribuir muito para a convivência fraterna e pacífica, para o respeito e a tolerância entre pessoas e grupos. É necessário o empenho decidido e decisivo de pessoas, grupos e instituições para vencer as múltiplas formas de violência e intolerância difundidas no mundo de hoje.
As religiões desempenham um papel fundamental na construção da paz, como tem enfatizado o Papa Francisco em diversas ocasiões, através de discursos e gestos simbólicos. A violência não condiz com os princípios e valores das religiões. Quando ocorre, contradiz e destrói, causa descrédito e destruição. A intolerância contra quem crê ou a intolerância praticada por quem crê em Deus são inaceitáveis na sociedade. Os cristãos e os membros de outras confissões religiosas, com tantas outras pessoas de boa vontade, são chamados a testemunhar a “fraternidade sem fronteiras”, que o Papa Francisco enfatizou na sua renomada carta encíclica “Fratelli Tutti”, cultivando o diálogo respeitoso e fraterno. Necessitamos superar a agressividade, os conflitos e a violência e construir uma cultura de diálogo e respeito. O caminho é longo, mas é possível ser percorrido passo a passo, com as mãos erguidas em oração e com as mãos estendidas ao próximo, especialmente a quem está ferido pelo caminho, à espera de um samaritano.