O guardião da fé
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Prof. Luís Roberto de Francisco

Em 31 de dezembro de 2007, com minha família, participei do Te Deum conduzido pelo Papa Bento XVI na Basílica de São Pedro. A beleza do templo unida ao espetáculo da chegada do pontífice, o acendimento teatral das luzes, a música do órgão e a presença da Guarda Suíça revelaram a grandeza da liturgia na presença do papa, cardeais, bispos e monsenhores. A euforia dos fiéis, no ponto central da Igreja, lembrava o tempo de João Paulo II, pois onde ele estivesse, havia uma apoteose, como um pop star.

Ao final da cerimônia, no cortejo de saída, cumprimentamos o papa desejando-lhe um ano novo feliz. Ele respondeu, olhos nos olhos, com um sorriso e um aceno dizendo: grazie! Fiquei impressionado com a sua timidez, o esforço para corresponder àquela multidão, diferente do pontífice anterior. Naquele momento entendi melhor quem era Bento XVI, um intelectual discreto, estudioso da Sagrada Escritura, guardião da fé em nossos tempos.

A sua trajetória brilhante de jovem professor de teologia na Alemanha, aos 25 anos especialista em Santo Agostinho e São Boaventura, o levou, uma década depois, ao Concílio Vaticano II, como perito teólogo.

A crise de fé, contemporânea aos tempos da Igreja pós-conciliar, decorrente de novas ideias filosóficas na Europa dos anos 60, teve no professor Josef Ratzinger uma figura fundamental para a sustentação da doutrina, reversão do relativismo e construção de uma teologia mais próxima dos fiéis. Como parte desse movimento de instrução da intelectualidade católica, surgiu a revista Communio, que ele criou com outros teólogos como Henri De Lubac, Hans Urs von Balthasar.

A ascensão ao episcopado correspondeu ao potencial que ele poderia oferecer à Igreja: em março de 1977, quando professor na Universidade de Ratisbona, foi nomeado Arcebispo de Munique e elevado a cardeal em junho. No ano seguinte foi eleitor de seu amigo, cardeal Wojtyla, no conclave que nos deu João Paulo II. Três anos depois o novo papa o levou a Roma, para ser o Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé.

Por mais de duas décadas, o cardeal Ratzinger foi o principal representante da ortodoxia da Igreja, escrevendo obras que o equiparam aos grandes pensadores do Catolicismo; trouxe a teologia católica aos nossos tempos.
Com a morte do papa em 2005, Ratzinger foi eleito pontífice com características muito diferentes de seu antecessor: João Paulo era midiático, gostava de viagens e multidões; abriu espaço aos jovens na Igreja. Bento XVI, discretamente, continuou defendendo a fé; a cada semana, nos encontros às quartas-feiras ou aos domingos, oferecia aulas de doutrina à Igreja.

Bento pavimentou o caminho para que seus sucessores desenvolvessem uma ação pastoral capaz de abrir o Cristianismo ao mundo com segurança, como tem feito o grande Papa Francisco. Ensinou a Igreja a meditar silenciosa e racionalmente, colocando a fé sobre as emoções, permitindo aos fiéis entender os mistérios da revelação evangélica.

Afinal, Bento XVI não deixou de ser um professor. Construiu um legado importante à Igreja do terceiro milênio.

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