Aflição, oração e fé
“Por que sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?” (Mc 4,40)
Caríssimos leitores e leitoras: poucas vezes na história estivemos em um tempo de aflição tão grande. A pandemia revelou inúmeras fragilidades em nossa sociedade. Talvez em nenhuma outra ocasião estivemos tão conectados, interligados nos mesmos dramas, compartilhando as dores comuns para todos, pois vivemos numa era em que a comunicação dos aparelhos eletrônicos e das mídias sociais facilitaram muito o diálogo e, por isso, tornam a vida mais prática. Porém, este enorme número de oportunidades também nos afoga num oceano de informações, muitas delas inverídicas, e de conteúdos que nem sempre unem, mas dividem. Aumentaram também o desemprego e a fome, e a carência nos serviços públicos, principalmente nas áreas da saúde e da educação.
Como não se afligir? É praticamente impossível não se preocupar. São tantas as responsabilidades de todos: os pais, o educador, o sacerdote, o governante, a liderança comunitária, etc. De fato, são tempos preocupantes. Realmente estamos em meio a uma tempestade, e as ondas nos assustam. O mar é grande, o vento é forte, e nós somos frágeis, dentro de um barco muito simples e frágil também.
Muitas vezes o nosso estado de espírito é semelhante ao dos discípulos, naquela noite tempestuosa em alto mar. Diante de tantos desafios, olhamos para o alto e perguntamos a Jesus: “Mestre, não te importa que pereçamos?” (Mc 4,38). É claro que o Mestre se importa! Como não se importaria? Ele que deu a própria vida na cruz por nós!
Nos momentos de aflição e de angústia, não devemos recorrer imediatamente às soluções fáceis e impensadas. A nossa salvação está, justamente, em buscar respostas no próprio Filho de Deus, à luz do Evangelho. Terapias, remédios, tratamentos, todas essas coisas são muito úteis. Mas sem a oração e sem a fé, não há como escapar das tribulações.
O que Cristo ordenou ao vento e ao mar, vale também para todos nós em muitas situações da vida: “Silêncio! Cala-te!” (Mc 4,39). Portanto, diante das crises, é preciso agir. Mas se antes da ação não vier a oração; se antes dos problemas que nos afligem e nos angustiam não vier o calar-se diante de Deus para ouvir a Sua vontade, não seremos capazes de vencer o mar revolto e muito facilmente seremos tragados pelas ondas traiçoeiras. Contra as aflições deste mundo, necessitamos de uma verdadeira vida de oração e de uma genuína fé.
Caríssimos leitores e leitoras: falar em oração e fé hoje em dia, neste mundo que tanto confia na tecnologia e na ciência, pode até parecer ingenuidade. Porém, se somos novas criaturas pelo Batismo e se estamos realmente em comunhão com Cristo, cremos que “o mundo velho desapareceu” e “tudo agora se tornou novo” (cf. 2 Cor 5,17), pois a novidade do Evangelho continua sempre atual, e justamente nos momentos mais intensos das tribulações é que precisamos de sua Verdade.
Caso contrário, as perguntas que Jesus fez aos discípulos, infelizmente servirão também para nós: “Por que sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?” (Mc 4,40). Será que ainda não sabemos, não cremos e nem testemunhamos o poder daquele a quem até mesmo o vento e o mar obedecem? (cf. Mc 4,41).
Em verdade, tenho certeza de que nós conhecemos sim, e muito bem, o tamanho poder de Deus, que tudo criou e em tudo colocou limites, até mesmo na maldade. Acontece, porém, que, em meio a tantas tempestades, é difícil não cair na tribulação e no desânimo. É preciso, porém, recordar que Deus também diz para tudo o que nos aflige: “Até aqui chegarás, e não além” (Jó 38,11).
Caríssimos leitores e leitoras: é o próprio Jesus que nos indica o caminho. Contra as aflições desta vida, utilizemos a ferramenta da oração, com muita fé. Para além disso, jamais nos esqueçamos de dar graças ao Senhor, porque ele é bom e eterna é a sua misericórdia (cf. Sl 106[105]). Deus sempre está conosco mesmo em meio às tempestades, porque nunca nos abandona.
Peçamos também à Mãe de Jesus, a Senhora do Desterro, que continue intercedendo por nós, a fim de que continuemos confiantes em Deus, firmes na fé e solícitos na caridade.
E a todos abençoo.
Dom Vicente Costa
Bispo Diocesano