O que ficou, então? – A Câmara Apostólica IV

por Evandro Antonio Correia
Quem disse que Administração Pública pertence somente à nossa atualidade? Inocêncio III, reformulou a vasta competência atribuída, originalmente, à estrutura da Câmara Apostólica, dando-lhe grande desenvolvimento. Durante seu governo, a Igreja e o papado, tornaram-se uma potência e a Câmara se tornou o organismo mais importante da Cúria Romana.
A sua relevante responsabilidade foi a de providenciar a manutenção econômica da residência e da Corte pontifícia, além de todo o pessoal adido à Cúria (todos os organismos que administram a Igreja). Por essas variadas atribuições, tornou-se rapidamente um órgão estável, organizado para exercer, também, poderes no campo da jurisdição civil e do contencioso administrativo (sim, administrava, julgava…). Assim, a esfera de sua competência era imensa, pois representava a administração pública do Estado pontifício, do seu tesouro e de seu fisco.
Mas, dentre os numerosos acontecimentos históricos da Câmara Apostólica, que incluíam o financiamento de guerras (no passado, é claro!), é dever individuar aqueles principais que chegaram até a atualidade, como a relevante função durante a «sede vacante». Até hoje, o nome «camerlengo», indica o cargo de quem dirige a Câmara Apostólica: era um bispo ou arcebispo que somente no século XV a função foi conferida à um cardeal. Pela grande importância que o cargo recebeu, no decorrer de sua história, seu máximo atingiu com a constituição apostólica de 1274, ao decretar que o Camerlengo não deixava suas funções em «sede vacante». Isto é, quando um papa morre, todos os responsáveis nomeados, em toda a administração da Igreja, que está no Vaticano, perdem suas funções. Assume o «mando» o Colégio cardinalício, tendo o decano como chefe a conduzir a sorte da Igreja e suas demais responsabilidades. E aqui duas exceções: o judiciário eclesiástico e o Camerlengo.
Sua absoluta importância, novamente incrementada em 1562, foi quando Pio IV dispôs que ao Camerlengo juntamente com os três cardeais das respectivas ordens (bispo, presbítero e diácono), fossem confiadas o fechamento do conclave e o governo do Estado. Passados quase 300 anos, em 1800, Pio VII (o que enfrentou Napoleão) providenciou um novo ordenamento das estruturas administrativas do Estado pontifício, restringindo sensivelmente as várias funções do antigo dicastério em decadência, em virtude dos novos ideais políticos e filosóficos, pós Revolução Francesa, com uma constante necessidade de progresso. Leão XII e Gregório XVI, reduziram ainda mais suas competências, retirando as atribuições judiciárias (ainda existiam penas cruéis), limitando-a somente ao fisco pontifício.
O drama final acontece com Pio IX em 1847, que sob os acontecimentos políticos foi obrigado a transformar os membros da Reverenda Câmara Apostólica, em membros do Conselho de Ministros, dispensando os oficiais do dicastério e confiando os cargos aos leigos, cedendo gradualmente à pressão da unificação italiana. Foi reduzida a um órgão de jurisdição do erário. Acabou por perder toda a residual competência, exercida durante a «sede plena», com o fim do poder temporal dos papas em 1870, quando o Estado pontifício foi incorporado ao Reino da Itália. O que ficou, então? Permaneceram as atribuições que lhe foram confiadas em tempos de «sede vacante».
Até a próxima!