Coronolândia e o país da loucura
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por Pe. Salathiel de Souza

Era uma vez um país de gente alegre e festiva, no qual a natureza exuberante encantava a todos. Uma terra na qual, onde se plantando, tudo dava. Tudo florescia, crescia e se multiplicava. O povo, sempre cordial, apenas lutava para ganhar o seu pão de cada dia. Em meio à labuta, dava os seus jeitinhos para celebrar a vida na forma de festa, churrasco e futebol.
Tudo transcorria normalmente, até que… Um momento: não se pode dizer que era tudo assim tão normal naquele lugar. Coisas escabrosas, inéditas e imprevisíveis aconteciam por lá cotidianamente. Especialmente no universo dos quatro poderes. Mas, enfim, um acontecimento fez mudar toda a realidade local.
Tão sutil quanto o sibilar de uma serpente; tão repentino quanto a chuva de verão; mais rápido do que verba pública entrando no bolso de corrupto: eis que surge do nada, vindo do extremo Oriente, uma praga que abalou as estruturas, as mentes e os corações daquele povo até então cordato e feliz, ao seu próprio modo.
Um tal de vírus, pior do que todas as pestes já datadas e conhecidas, começou a se espalhar. Instantaneamente as pessoas passaram a falecer somente por causa dele. Desenrolou-se um mistério: ninguém mais morria de enfarto, câncer ou problemas renais. Os acidentes de trânsito, os homicídios e os crimes passionais, cessaram de vez.
Os mandatários não sabiam no que mandar. Os estelionatários sabiam no que e quando mandar, em tudo. O Gigante Tribunal Nacional, arbitrariamente (mas o dever do juiz não é arbitrar, mesmo que seja em causa própria?), decidiu que o destino de todos estava nas mãos de alguns. E aquele lugar, que até então tinha nome próprio, foi obrigado pela realidade vigente a adotar outra nomenclatura, tornando-se a Coronolândia.
Tudo tornou-se terrivelmente estranho. Ninguém saía de casa e as ruas ficaram desertas. Eu me senti tão só, dentro do Simca Chambord. Entretanto, para os motoboys, frentistas e lixeiros a praga não podia existir de verdade. Auto-exilados, em condomínios fechados, inicialmente sentiram-se confortáveis. O estoque de vinho, comida congelada e seriados de streaming inicialmente os saciava. Com o passar do tempo, nem isso bastou.
Sem perceber, o povo da Coronolândia foi ficando doente. Mas não da praga e sim da cabeça. A loucura paranóica disseminou-se mais rápido que sarampo. Sem motivo concreto, a maioria passou a atitudes irracionais: banhos de creolina, jatos de ar, álcool gel nas orelhas, ozônio retal, máscaras de Chernobyl, isolamento social e crença total e irrestrita nos meios de comunicação social.
O caos só não foi total porque o governo distribuiu dinheiro para metade da população. Assim, permaneceram acesas as churrasqueiras e foi mantida a paz social. Os otimistas foram crucificados como irresponsáveis.
Os pessimistas, agregando a si o dom do vitimismo, ganhavam crédito, likes e grana, muuuuita grana. E como sinal do ápice da loucura, felipes-netos foram alçados instantaneamente aos píncaros da glória e ao status de salvadores da Pátria. Via Youtube, claro.
Os relatos documentados dão conta de que a praga afetou a vida da Coronolândia por meses a fio. Porém, não há registros de como terminou a estória. Através de hieróglifos e postagens antigas de um negócio chamado “twitter”, onde todo mundo piava, as últimas transcrições revelam que algo muito sujo aconteceu: o Gigante Supremo assumiu uma ditadura judicial e… Acabou.
Graças ao Bom Deus, tudo isso aconteceu há milênios. Toda e qualquer comparação com a atual realidade é mera ficção, baseada em fatos reais.

Será?

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