Lembranças não se apagam!
por Lázaro José Piunti
Nos restos do domingo e começos da madrugada de segunda-feira moradores do Bairro Liberdade viram o brilho pavoroso do fogo consumindo impiedosamente as instalações da Oficina Romanatto.
E lembranças me acorreram à mente pondo-me a recordar dos tempos longevos daquela empresa familiar e acolhedora. Fundada no início da década de 1950 pelos saudosos irmãos Antônio e Waldemar Romanatto, a Oficina possuía eficiente setor de Funilaria dirigida pelo dedicado Wilson Romanatto, além da área de Pintura de automóveis. Almoxarifado com extensa variedade de peças favorecia o bom atendimento da enorme clientela.
Quero dizer, desde logo, que a seriedade dos proprietários na execução dos serviços e o respeito com as pessoas se constituíram sempre na marca do seu sucesso. Explico o motivo desta afirmação.
Em junho de 1959 meu pai vendera o sítio onde criara 12 filhos. Eu, caçula, ainda não completara 13 anos, acompanhei pai, mãe, avó e irmã e viemos todos residir no Bairro da Estação, onde funcionava a Oficina. Dois dias depois já estava no meu 1º emprego.
Seu “Toninho” Romanatto aceitara me contratar por meio período, a pedido do meu irmão também Toninho, que insistira (“o menino não pode ficar zanzando na rua”!). E assim comecei cedo a valorizar a importância da hierarquia, o gosto do trabalho honrado e o sabor do salário justo.
Aos domingos, acompanhando meu pai à missa na Igreja do Bom Jesus, eu, coroinha dos padres jesuítas, segurava a patena, quando o sacerdote distribuía a hóstia consagrada aos penitentes. Dentre eles, meus patrões! O tempo passou! O povo me fez prefeito, dotei o antigo Bairro das necessárias melhorias e lhe dei novo nome: Liberdade! Porém, prefeito ou não, o carinho pelos ex-patrões continuou. Sem temor e construído no respeito.
Nas tardes de domingo íamos ao estádio ver jogos do Ituano. Enquanto o menino de outrora vibrava nas arquibancadas, Toninho Romanatto, o antigo patrão, renunciava a esse privilégio ficando na portaria. Cooperador do clube a cuidar da bilheteria! Recordar enche o coração de emoção! Faz sentir o quanto os seres humanos eram mais gentis, disponíveis e solidários. Deus do céu! Como o tempo esgarçou valores.
Quando se desfizeram os laços da fraternidade entre as pessoas? Em que momento se romperam os vínculos da sensatez que tornavam os homens mais felizes?
No entanto, o fogo que destruiu a Oficina Romanatto foi incapaz de extinguir as lembranças que guardo na alma das figuras amigas dos seus fundadores.
Não são vestígios ou miragens. São lampejos de luz. Toninho, Waldemar e Wilson seguem, na eternidade, mecânicos de Deus em outras oficinas do Universo!