A moda se amolda
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por Bernardo de Campos

No curto mandato do Presidente Jânio Quadros, expediu-se certa feita às
repartições públicas federais, – era o ano de 1960 – uma autorização a quem
desejasse adotar um uniforme de trabalho, bem aos moldes do clima tropical
brasileiro. Tratava-se de uma indumentária clássica, conhecida mais pela sua
expressão em inglês, que a mente cansada se nega de neste momento relembrar. Uma camisa de manga curta, solta por sobre a calça, ambas da mesma
cor e tecido leve. A idéia não pegou.
Pudor? Receio do funcionário público, que àquele tempo ainda tinha salário mais digno, de parecer um trabalhador comum? Como o próprio Presidente deixou o cargo, essa tentativa morreu de vez.
Esse fato é lembrado porque aos poucos a moda se amolda.
Está aí um chiste, – a moda se amolda – cuja propriedade a crônica reivindica, mas que com benevolência libera o seu aproveitamento, para que a
utilizem, sem precisar pedir licença. Quem gostar, que usufrua à vontade.
Sim, a moda se amolda.
De qualquer maneira, ela, a moda, se é ousada em certos momentos, tenha-
-se também o cuidado de respeitar hábitos, lugares e costumes. Por isso que
causa ainda uma certa estranheza que o turista, bem vindo sempre, participe
da missa de preceito na Matriz local, vestido de bermuda ou às vezes até de
short e de camiseta sem mangas ou de mera regata. Bermuda que chegue
aos joelhos ou até algumas que os cubram, sim. Mas camiseta sem manga?
Jamais.
Vem o assunto à baila, enfim, por causa da naturalidade de como no litoral,
de ordinário, os homens se apresentam bem à vontade nas cerimônias religiosas. Sem caracterizar com isso abuso ou desrespeito. Mas quem negaria a
canícula dos últimos tempos?
Entretanto, o calor em excesso, ele não poupa nem regiões litorâneas, nem
cidades distantes do mar, nem áreas planas ou montanhosas. Ainda mais
que, a cada dia, o aquecimento global avança acentuadamente. Em alguns
países, morre-se de calor. Pode? Quando se viu um fenômeno desses há uma
década, ontem portanto, pode-se dizer? Um fato atual.
A partir daí que, também nesta cidade, os próprios moradores, um ou outro, aos poucos, compareçam às missas de bermuda. Sinceramente, desde
que de bermudas mesmo – nunca shorts – alguns inclusive com certa elegância, não fica fora de propósito que assim se apresentem. Afinal de contas,
também em Itu, o calor quando chega, chega para valer. E que essa abertura
seja concedida, vedada terminantemente liberdade que a ultrapasse. Bermuda e camisa decentes, uma indumentária ao feitio do clima.
Na mesma teia, interessante relembrar, há dez ou quinze anos, de uma
missa em dia de semana, no bairro de Santa Felicidade, em Curitiba, do espanto de ter-se visto um padre, cujo sotaque denunciava provável nacionalidade italiana, a celebrar de tênis e de várias cores. Com o acréscimo de que
a alva lhe era um tanto curta. Tal surpresa, fez-se matéria de uma das tantas
crônicas, no espaço da coluna Última Página (jornal A Federação de outras
épocas), de reparo a tal impropriedade, com a devida ressalva de que o uso de
tênis pelo padre só faria sentido por algum problema de saúde ou especificamente nos pés. Na ocasião, bom de se dizer, que estava ainda muito presente
o ensinamento do Frei Constâncio Philips, no curso preparatório à primeira
turm a de Ministros Extraordinários da Eucaristia, cuja investidura se deu
no dia 8 de dezembro de 1971. Ministros Extraordinários da Eucaristia que,
anos depois, passaram a ser denominados Ministros da Comunhão. O saudoso frade carmelita recomendava aos candidatos (todos os 22, selecionados
e convidados por ele), que, no altar, usassem sempre sapatos pretos. E bem
engraxados.
Tanto a moda se amolda que essa crônica, oportuna à época, hoje está reconhecidamente envelhecida. O uso do tênis se disseminou de vez.
A moda se amolda.
Um fato.
Um fato, no entanto, que jamais dispensa uma boa dosagem de bom senso

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