Na Santa Casa de Itu (3)
Inaugurada oficialmente a Santa Casa, começam a afluir os doentes. As religiosas se entregam com fervor à nova atividade. Desdobram-se em serviços, não só de auxílio aos enfermos, mas também domésticos, pois têm apenas um empregado para todos os afazeres, até mesmo os pesados. Mas um dia as deixa, porque não se submete a cuidar de um negro, naquele tempo de preconceitos raciais. Batera às portas um pobre escravo bem doente. O empregado revolta-se por ver que as Irmãs o recolhem. “Onde já se viu um branco servir a um preto? Vai-se.” As abnegadas religiosas, que vêm no preto velho um membro do corpo místico de Cristo, fazem compreender aos que têm conhecimento do fato que todos têm direito à mesma solicitude e carinho, e pouco a pouco, a força convincente de seu exemplo arrasta outras almas a segui-las em seu apostolado.
Madre Teodora, para atender ao chamamento do Provedor do hospital, é obrigada a desfazer-se de três professoras no Colégio. Faz verdadeiros malabarismos de boa vontade para compensar a falta que lhe fazem esses elementos no ramo educacional, enquanto espera o reforço prometido por Madre Felicidade.
Faz companhia às novas enfermeiras, encoraja-as a suportarem com ânimo forte as privações e sacrifícios que as esperam em seu novo setor. Ao deixá-las entregues ao seu mister de curar, dirige-lhes as encorajantes palavras, que até hoje servem de mote às suas filhas espalhadas pelas casas de saúde sob direção das Irmãs de São José: “Coragem, minhas caras filhas. Tendes a melhor parte. Deus será para vós o que fordes para os doentes. Ah! Se Jesus Cristo voltasse visivelmente à Terra, vergado pelo sofrimento, com que presteza iríeis em seu auxílio! Que satisfação seria para vós prodigalizar-lhe a cura! Que felicidade ser escolhida por Ele para uma missão tão honrosa. Pois bem, sois possuidoras desta ventura. Deixo-vos no Coração de nosso doce Salvador.”
Em dois anos atendem a mais de dois mil enfermos. Melhor do que nós, homenageiam o espírito de sacrifício das Irmãs as seguintes palavras do médico Dr. João Ferraz da Luz, em nome da Mesa Administrativa: “Todo o trabalho pesa sobre as Irmãs de São José, essas heroínas da caridade e da abnegação que, com um infatigável zelo e uma dedicação sem limites, não recuam diante de serviço algum, nem mesmo diante dos trabalhos, para os quais nossos empregados e nossos próprios escravos, manifestariam repugnância. A este trabalho excessivo, uma delas que era diretora da Casa, comprometeu de tal forma a saúde que será difícil restabelecer-se.”
É que não importa a essas eleitas nem o cansaço, nem o próprio restabelecimento. O que importa é que o Cristo viva e reine, e que, através das chagas do doente resplandeça a luminosidade da doutrina do amor, um dia pregada na Judeia… no topo de uma cruz redentora…
01 de junho de 1957
Maria Cecília Bispo Brunetti
Acervo – Museu da Música – Itu