Deus chora pelas vítimas da guerra na Ucrânia
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Maria nos ensina a não ter vergonha de nossas lágrimas, porque chorar significa “abrir-se ao Pai e aos irmãos”, deixar-se comover, “comover pelas feridas daqueles que encontramos pelo caminho; saber compartilhar, saber acolher, saber alegrar-se”. E as lágrimas de Maria “são também um sinal do pranto de Deus pelas vítimas da guerra que está destruindo não só a Ucrânia”, mas todos os povos envolvidos, “o povo vitorioso”, assim como “o povo derrotado” e também “aqueles que a observam”. Assim o Papa Francisco saudou os quase três mil representantes da comunidade pastoral do Santuário de Nossa Senhora das Lágrimas de Treviglio, no norte da Itália, reunidos este sábado (23/04) na Sala Paulo VI, e lhes confiou a certeza de que a Mãe aceitou a súplica confiada ao seu Imaculado Coração “e intercede pela paz, Ela que é a Rainha da Paz”.

500 anos do milagre das lágrimas no quadro da Virgem

A comunidade pediu para se encontrar com o Papa como parte das celebrações dos 500 anos do milagre da lacrimação de uma imagem da Virgem com o Menino, conservada no convento das agostinianas em Treviglio, dia 28 de fevereiro de 1522, enquanto as tropas francesas do General Lautrec estavam prestes a atacar o vilarejo. O general, devoto de Nossa Senhora, depôs seu capacete e sua espada, seguido por seus soldados, e levantou o cerco à cidade, que foi salva da destruição.

As lágrimas de dor e de alegria de Jesus

Aos fiéis presentes na Sala Paulo VI, acompanhados pelo pároco padre Norberto Donghi e pelo arcebispo de Milão dom Mario Delpini, Francisco recordou os outros santuários dedicados à Virgem Maria que chora, de Siracusa, sul da Itália, a La Salette, na França. “Mas o de vocês – enfatizou – é muito mais antigo”. E explicou, oferecendo a todos uma intensa meditação sobre as lágrimas de Maria, que as lágrimas da Mãe “são um reflexo das lágrimas de Jesus”. Ele chorou, como nos diz o Evangelho, no túmulo de seu amigo Lázaro e diante de Jerusalém. Em ambos os casos, lembrou o Pontífice, “eram lágrimas de dor. Mas podemos imaginar que Jesus também chorou de alegria, por exemplo, quando viu os pequenos, as pessoas humildes aceitando entusiasticamente o Evangelho”.

O choro de Maria, sinal da compaixão de Deus

E Maria, “a primeira discípula”, seguiu seu Filho “também na santidade de seus sentimentos, de suas emoções, até mesmo em suas risadas e no pranto”. Assim, continuou o Papa Francisco, “certamente lágrimas de alegria brotaram de seus olhos quando ela deu à luz a Jesus” e “viu os pastores e os Magos prostrarem-se diante d’Ele”. E ela chorou lágrimas amargas, no final, seguindo-o no caminho doloroso “e enquanto aos pés da cruz”. As lágrimas de Maria, esclareceu o Papa, “foram transformadas pela graça de Cristo, como toda a sua vida”. Portanto, “quando Maria chora, suas lágrimas são um sinal da compaixão de Deus”.

Deus tem compaixão por nós, sempre; e Deus quer nos perdoar. E lembro-lhes de uma coisa: Deus sempre perdoa! Sempre! Somos nós que nos cansamos de pedir perdão. E é por isso que as lágrimas de Nossa Senhora são um sinal da compaixão de Deus, e esta compaixão sempre nos perdoa; são um sinal da dor de Cristo por nossos pecados, pelo mal que aflige a humanidade, especialmente os pequenos, e os inocentes, que são os que sofrem.

Ucrânia: uma guerra que está destruindo a todos

Francisco recordou em seguida a referência à guerra na Ucrânia feita em sua saudação pelo pároco padre Norberto:

As lágrimas de Maria são também um sinal do pranto de Deus pelas vítimas da guerra que está destruindo não apenas a Ucrânia; sejamos corajosos e digamos a verdade: ela está destruindo todos os povos envolvidos na guerra. Todos eles. Porque a guerra não destrói apenas o povo derrotado. Não. Também destrói o vencedor; também destrói aqueles que a assistem com notícias superficiais para ver quem é o vencedor, quem é o derrotado. A guerra destrói a todos. Estejamos atentos com isso.

Maria, Rainha da Paz, acolheu nossa súplica

Ao seu Imaculado Coração, recordou o Pontífice, “confiamos nossa súplica e estamos certos de que a Mãe a aceitou e intercede pela paz, porque ela é a Rainha da Paz”. E amanhã, frisou Francisco, “será o Domingo da Misericórdia”. E ela é a Mãe da Misericórdia. Ela sabe o que significa misericórdia, porque a ‘hauriu’ de Deus”.

Chorar, pedir perdão e abrir-se ao Pai e aos irmãos

Para o povo de Treviso, o Papa Francisco lembrou que “durante cinco séculos sua terra foi regada pelas lágrimas de Maria; de geração em geração seu povo tem sido acompanhado por sua ternura materna”. Ela “os ensina a não ter vergonha das lágrimas”: “não devemos ter vergonha de chorar” porque os santos “nos ensinam que as lágrimas são um dom, às vezes uma graça, um arrependimento, uma libertação do coração”.

Chorar significa abrir-se, romper a carapaça de um eu fechado em si mesmo e abrir-se para o Amor que nos abraça, que está sempre esperando para nos perdoar. Tal é o coração de Deus. Deus está esperando; esperando pelo quê? Pelo perdão, para nos perdoar. Ele está inquieto, é incorrigível: quer perdoar, perdoar… Ele só pede que nós lhe peçamos perdão. Abrir-se ao bom Pai e também abrir-se aos nossos irmãos.

Aprender a chorar também diante dos dramas do descarte

Chorar, continuou o Papa, é “deixar-se comover pelas feridas daqueles que encontramos pelo caminho; saber compartilhar, saber acolher, saber alegrar-se com aqueles que se alegram e chorar com aqueles que choram”. E confesso que acredita que em nosso tempo “perdemos o hábito de chorar ‘bem'”. Perdemos “o choro que vem do coração, o verdadeiro choro como o de Pedro quando ele se arrependeu, como o de Nossa Senhora”.

Nossa civilização, nosso tempo, perdeu o sentido do choro. E devemos pedir a graça de chorar diante das coisas que vemos, diante do uso que se faz da humanidade, não só guerras – falei delas – mas o descarte, anciãos descartados, crianças descartadas mesmo antes de nascerem… Tantos dramas de descarte; aquele que é um homem pobre ali e não tem do que viver é descartado, descartado. As praças, as ruas cheias de sem-teto, as misérias de nosso tempo deveriam nos fazer chorar e precisamos chorar.

Peçamos a graça de chorar. Todos

Há uma missa, recordou Francisco, na Liturgia católica para pedir o dom das lágrimas. “Mas vocês, que têm Nossa Senhora ‘tão próxima'”, peçam este presente.

E a oração daquela missa diz assim: “Ó Senhor, Tu que tiraste água da rocha, deixa que as lágrimas fluam da rocha do meu coração”. O coração da rocha que esqueceu como chorar. Por favor, peçamos a graça de chorar. Todos.

Ternura, compaixão, proximidade. O estilo de Deus

Em conclusão, o Pontífice sublinhou que em nome da comunidade “Nossa Senhora das Lágrimas”, existe toda uma pastoral: uma pastoral de ternura, compaixão, proximidade.

Ternura, compaixão e proximidade. Este é o estilo de Deus. O estilo de Deus é proximidade, compaixão e ternura. Este é o estilo de Deus. Há um estilo pastoral que diz respeito a todos: sacerdotes, diáconos, fiéis leigos, consagrados… Todos próximos, compassivos e ternos. E todas as idades, todas as estações da vida.

Todos “devemos sempre aprender de Maria a seguir Jesus, a deixar seu Espírito moldar nossos sentimentos, nossos desejos, nossos planos e nossas ações de acordo com o coração de Deus”, exortou por fim o Pontífice.