Um modesto jubileu
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Se me perguntarem o que mais eu fiz na vida, acho que foram ensaios: certamente milhares! Quem vai a um concerto não tem ideia do que existiu antes: escolha de repertório, estudo, preparação de partituras, preparação vocal, ensaios de leitura e naipe, ensaios de coro, marcações de interpretação, sem falar nas relações humanas que criam ambiente ótimo ou de tensão, tudo isso antes de chegar à apresentação.
A capacidade de recriar uma obra musical é algo fascinante. Alguém, em algum tempo, criou uma mensagem sonora e escreveu-a para registrar e poder fazer novamente. Os músicos leem a obra do outro e interpretam do seu jeito, com sua bagagem. Nunca é igual.
A música, infelizmente, é um fazer incomum entre nós, são poucos os cantores, instrumentistas, muito menos os regentes. A mídia sepultou essa cultura com ritmos e melodias massificados, tudo igual. Antigamente o público era maior, gente que queria ouvir, aprender.
Há uns meses, procurando um papel nos alfarrábios de casa, achei uma referência e me lembrei de uma missa há quarenta anos, um sétimo dia, quando o coro precisou de um regente, dada a emoção do momento, e ele brotou do coro: o mais jovem, pouco preparado, mas voluntarioso e estimado das tias, que decidiam tudo no Coro do Bom Jesus. Não parei mais: regi quatro ou cinco grupos, em missas, rezas, concertos, performances; fizemos música a capela, com piano, com órgão, harmonium, orquestra, mas sempre com coro.
Um coro se constrói sobre a grandeza do cantar, de colocar pra fora uma energia positiva, que equivale a rezar, meditar, filosofar, enfim, é um fazer que transmite os melhores fluídos, mesmo que não tenha qualidade. Se tiver, a mensagem será completa!
A formação não foi continuada, cursos livres, o mais importante no Festival de Artes de Itu e alguns anos de faculdade. A escola mesmo foi o Vozes de Itu, trinta anos onde tudo foi possível, todas as propostas aceitas e vivenciadas. Dos saraus trabalhosos à liturgia católica, conseguimos, juntos, trazer à vida o que os compositores de Itu criaram, repertório de diversos tempos da história local, que ninguém sabia como era, patrimônio imaterial extraordinário que muitas cidades gostariam de ter só um pouquinho, para mostrar aos sete ventos e chamar a atenção do mundo.
Desde aquela missa, há quarenta anos, há muito a lembrar e celebrar, mas sobretudo a agradecer e comemorar a todos que participaram: cantores, músicos, apoiadores, financiadores, enfim, um trabalho de muitas mãos que modificaram a trajetória da música em Itu, em centenas de apresentações.
A Schola Cantorum de Itu é a oportunidade de levar adiante e manter vivo o patrimônio da música religiosa ocidental, de maneira geral, e da música ituana em particular.
O Museu da Música guarda muita coisa, mas é cantando que a mensagem continua viva, ligada à nossa gente, como parte ativa e integrante do nosso sentido de viver.
O jubileu é modesto, mas quero comemorar com o Coro do Bom Jesus vivo novamente!05