A oração dos pobres  eleva-se até Deus
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por Dom Arnaldo Carvalheiro Neto

Bispo Diocesano de Jundiaí

 

No próximo dia 17 de novembro, celebramos em toda a Igreja, o Dia Mundial dos Pobres. Esse evento, instituído pelo Papa Francisco, recorda-nos a importância de sermos cristãos comprometidos no cuidado com os mais necessitados, os preferidos de Jesus. Trata-se de uma ocasião propícia para manifestarmos nossa compaixão aos que padecem das mazelas da indiferença humana, em especial, as vítimas das desigualdades e injustiças do nosso tempo. Todavia, esse dia recorda-nos a riqueza que os pobres possuem. Na sua simplicidade, eles tocam o coração de Deus com sua oração. Assim, o Papa convida-nos, neste ano de 2024, a aproximarmos-nos dos pobres com nossa atenção, oferecendo-lhes, em primeiro lugar nosso sorriso e presença, para que aprendamos com eles a elevar nossa oração a Deus na gratuidade de quem não tem nada para barganhar, nada para retribuir, a não ser o próprio coração.
No último dia 13 de junho, dia de Santo Antônio, o Papa Francisco publicou a mensagem anual para o VIII Dia Mundial dos Pobres. Com o lema “a oração dos pobres eleva-se até Deus”, o Pontífice nos exorta a meditar com Eclesiástico 21,5, da tradição sapiencial de Israel. O versículo chama-nos a nossa atenção para a oração daqueles que foram injustiçados e sofreram com as maldades dos homens. Por isso, como nos recorda a Escritura, “a oração do pobre vai direto aos ouvidos de Deus”. Assim, Francisco nos chama a fazer comunhão com os empobrecidos, rezar com eles, ouvir seu clamor e suas necessidades numa atitude de presença e escuta atenta. Quantas vezes elaboramos discursos para falármos “dos” pobres ou “aos” pobres e nos esquecemos de sentar com eles para entender as causas de sua pobreza. Quando isso acontece, reduzimos a compreensão das necessidades humanas a ideários sociológicos ou propostas meramente assistencialistas.
O Papa convida-nos a um passo adiante na direção dos empobrecidos: rezar com eles para aprender a escutá-los. A encíclica Evangelii Gaudium (EG) recorda-nos que a pior discriminação que sofrem os pobres é a falta de cuidado espiritual. Eles têm necessidade de Deus e não podemos deixar de oferecer-lhes a sua amizade, a sua bênção, a sua Palavra, a celebração dos Sacramentos e a proposta de um caminho de crescimento e amadurecimento na fé. Desse modo, uma autêntica opção preferencial pelos pobres deve traduzir-se, principalmente, numa solicitude religiosa privilegiada e prioritária (cf. EG 200). Dar prioridade aos pobres em nossa caminhada pastoral é promover uma equidade eclesial no atendimento às comunidades, oferecendo as mesmas oportunidades de integração à vida sacramental aos fiéis, sejam eles de paróquias de centro ou de periferias. Mais do que isso, é compreender sua linguagem e seus anseios, suas dificuldades e seus sonhos, para que a Igreja, Mãe amorosa, conduza seus filhos à salvação eterna, promovendo uma autêntica conversão à vida, em todas as suas dimensões.
Rezar com os pobres significa também aprender onde está a verdadeira riqueza da Igreja. Vivemos tempos em que o discurso do mérito contamina a experiência da graça. Nessa lógica, típica de uma mentalidade mercantil, substituímos a relação de confiança com o Pai que conhece nossas necessidades por uma dinâmica perigosa de barganha. Esperamos de Deus uma retribuição por nossos feitos que, imperativamente, lançam-nos numa competição cruel, onde inclusive as práticas religiosas podem ser confundidas com um comércio. Imaginamos que a riqueza está mais em receber do que em dar. Os pobres nos encaminham para uma direção oposta. Ante a recorrente injustiça que os impossibilita de usufruir dos bens materiais deste mundo, os empobrecidos apostam numa confiança filial em Deus, seu único refúgio. A oração do pobre eleva-se até Deus porque não se fia de intermediários que negociam a graça. A oração do pobre é simples, humilde e gratuita e, por isso, conquista o coração do Senhor. Não esperando nada dos homens, esperam tudo de Deus.
Por fim, somos chamados a aprender com os pobres que as coisas mais preciosas do mundo não têm preço. Os pobres são enriquecidos de sentimentos e valores humanos que foram, com o avanço da lógica do capital, subtraídas de nossas relações. Na minha experiência como padre e agora como bispo, tenho presenciado a alegria contagiante de nossos irmãos empobrecidos em nossas comunidades. Eles são pobres das coisas que têm preço. São ricos das coisas que têm valor! Mais do que isso: eles descobriram que as coisas mais importantes da vida não são coisas!
Convido nossos amados irmãos e irmãs da Diocese de Jundiaí a vivenciar com alegria e entusiasmo esse Dia Mundial dos Pobres. Peço reiteradamente que promovamos em nossas comunidades ações que nos aproximem de nossos irmãos necessitados. Ações que nos permitam nos sentarmos juntos, ouvi-los, sorrir com eles. Precisamos redescobrir a beleza de sorrirmos juntos, mesmo que para isso esforcemos-nos um pouco mais para entender o que ainda os faz chorar.

E que o Dia Mundial dos Pobres nos ensine que o Reino é Gratuito!