Eucaristia: pão verdadeiro e pão da missão
“Todas as vezes que comerdes desse pão e beberdes desse cálice,
proclamais a morte do Senhor, até que ele venha” (1Cor 11,26).
Caros leitores e leitoras: a Solenidade de Corpus Christi está no calendário da Igreja desde 1264, quando a data foi oficialmente definida pelo então Papa Urbano IV, como celebração comemorativa a um dos princípios mais importantes da fé cristã: o Sacramento da Eucaristia.
É a festa da presença amorosa de Jesus em meio à sua Igreja, ao seu povo, pois a Eucaristia é o sacramento do amor por excelência. São próprios do amor a proximidade e o rebaixamento. Por isso, é mais do que justo reconhecer em tal sacramento um amor que supera todos os amores no céu e na terra. Sendo a proximidade uma realidade comum a quem ama, Jesus quis, de maneira tão simples, fazer-se presente para nos dar a felicidade de sua íntima amizade.
No Novo Testamento, há quatro passagens que relatam a instituição da Eucaristia. São elas: São Mateus (26,26-28), São Marcos (14,22-24), São Lucas (22,19-20) e São Paulo (1Cor 11,23-25). Há também o capítulo 6 do Evangelho de João, que é profundamente eucarístico, principalmente no chamado discurso do Pão da Vida (cf. Jo 6,22-71). Portanto, o Evangelho de São João não traz propriamente o relato da instituição da Eucaristia, que é substituído pela narração do lava-pés (13,1-11), sinal do serviço humilde e do amor mútuo. Pois sem amor sincero e fraterno entre nós, pouco sentido teria a Eucaristia.
Caríssimos: como sabemos, além da fome material, o ser humano traz consigo outra fome, uma fome que não pode ser saciada com alimento comum. É a fome de vida, fome de amor, fome de eternidade. Já no Antigo Testamento o maná (cf. Ex 16,4-5.13-35), como toda experiência do Êxodo, é o sinal de uma comida que sacia a fome mais profunda que existe no ser humano, comida que vem do céu, dom da bondade de Deus. Mas é o pão que não sacia por completo a fome da pessoa humana.
Jesus é quem nos dá este alimento sobrenatural, que é Ele mesmo, o Pão Vivo que dá vida ao mundo. Portanto, o Corpo de Cristo é o pão que dá a vida eterna, porque a essência deste pão é o Amor (amor dele por nós; amor dos irmãos entre si, isto é: comunhão). Na Homilia da celebração da Santa Missa na Solenidade de Corpus Christi, o Papa Francisco afirmou: “Na Eucaristia se comunica o amor do Senhor por nós: um amor tão grande que nos nutre com Ele mesmo; um Amor gratuito, sempre à disposição de todos os famintos e necessitados de restaurar as próprias forças. Viver a experiência da fé significa deixar-se alimentar pelo Senhor e construir a própria existência não sobre bens materiais, mas sobre a realidade que não perece: os dons de Deus, sua Palavra e seu Corpo” (19/06/2014).
Fica claro, assim, que Eucaristia e missão são realidades que se entrelaçam. Seria um grande erro pensar no compromisso eucarístico somente em relação à nossa santificação pessoal, sem a nossa comunhão fraterna no interior da comunidade, que é a Igreja. Esse abençoado Sacramento nos impele para o mundo, para irmos ao encontro do próximo, no testemunho fiel e autêntico ao Senhor Vivo e Ressuscitado.
Assim, uma comunidade que celebrasse a Eucaristia fechada em si mesma, sem se preocupar com o anúncio e testemunho de Jesus ao mundo, sobretudo no serviço aos mais pobres, na defesa da justiça e da paz, na proclamação do Evangelho da vida e na denúncia de tudo quanto fira e contrarie o plano de Deus para a humanidade, seria infiel à Eucaristia e indigna de participar dela. Na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium (“A Alegria do Evangelho”), o Papa Francisco salienta que “a intimidade da Igreja com Jesus é uma intimidade itinerante, e a comunhão ‘reveste essencialmente a forma de comunhão missionária’. Fiel ao modelo do Mestre, é vital que hoje a Igreja saia para anunciar o Evangelho a todos, em todos os lugares, em todas as ocasiões, sem demora, sem repugnâncias e sem medo” (n. 23).
Neste ano, mesmo que ainda não possamos fazer manifestações vistosas e públicas de nossa fé na Eucaristia, devido à pandemia, temos a ocasião para renovar nossa consciência sobre os diversos significados e implicações da nossa fé no dom precioso da Eucaristia desabrochada na missão. A festa de Corpus Christi nos relembra que, como católicos, a essência da nossa vida é: Cristo na Eucaristia, na Palavra e no próximo. Que os frutos sejam abundantes!
A todos abençoo!
Dom Vicente Costa
Bispo Diocesano de Jundiaí