A acolhida às órfãs (1)
Meu benévolo ouvinte! Ao retrocedermos o tempo, fixando nossa imaginação na figura jovem de Madre Teodora, cada vez mais seu vulto se agiganta e se impõe à nossa admiração.
Pioneira e desbravadora de corações, não se contenta ela em ser apenas a educadora das meninas ricas do segundo império. Dotada de entranhado amor à pobreza, que se traduz eloquentemente em todos os seus atos, aporta à terra de Santa Cruz já com os olhos voltados para os pobres e pequeninos do rebanho, reservando-lhes o melhor de sua abnegação.
Mal começa a funcionar o Colégio, já umas meninas abandonadas são acolhidas sob o seu teto, e num cantinho da Casa ainda pequena e apertada, já têm onde reclinar a cabeça, já têm um prato de comida para matar a fome, já têm com que cobrir a sua nudez…
Órfãs de carinho, órfãs de tudo, estas crianças, que nada têm, de nada mais precisam ao entrar ali, porque a Divina Providência sempre vem em auxílio da boa Madre, feliz de poder acolhê-las em sua dupla pobreza: necessitadas de bens materiais e desprovidas da afeição maternal. Como não lhe falará à sensibilidade esse punhado de crianças sem mãe, se ela também curtira a dor amarga da orfandade!
Sobrecarregada de compromissos, mal compreendida às vezes pelos que viam nas religiosas simples aventureiras, vindas aqui para ganhar dinheiro a nada mais, Madre Teodora sonha com um pavilhão próprio onde agasalhar melhor as órfãs.
Consegue-o, em 1886, ao regressar de sua viagem à Europa, aí matricula dezesseis meninas, que educará cristãmente, preparando-as para serem, no futuro, mulheres sérias e boas mães de família. Dá-lhes uma instrução adequada à sua condição social, insistindo por incutir-lhes grande amor ao trabalho, à ordem e à economia.
A privilegiada fundadora tudo prevê e com a ajuda de pequenas poupanças, donativos e tudo mais que lhe sugere sua industriosa caridade, vela pelo futuro daquelas, que um dia bateram à sua porta, pedindo asilo para a sua orfandade. Ao saírem do Colégio, dá-lhes uma pequena soma para suas primeiras necessidades.
Não contente de ter um orfanato interno, seu zelo pela pobreza sugere-lhe a criação de uma escola gratuita para as meninas pobres, no Externato. Pretas, brancas, mulatas, todas têm um lugar no Patrocínio. Madre Teodora, com seu espírito de fé, via nelas almas resgatadas pelo sangue de Cristo, e provia às suas necessidades com ternura maternal. Estendia às famílias essa solicitude, dando-lhes com que matar a fome dos filhos e até mesmo pagando-lhes o aluguel da habitação. Dava com perseverança e abundância, e não se zangava se acontecia de ser enganada. Achava melhor dar mesmo a quem não tem necessidade que correr o risco de negar auxílio a um verdadeiro pobre.
Ao dar a eles, sabia estar emprestando a Deus, e por isso, ao contemplar as suas órfãs, exclamava estar ali o seu “banco”… Ali estava o capital empatado, do qual recolheria fartos juros! O melhor meio para receber muito da Providência é dar muito aos necessitados. Suas Irmãs a ouviram sempre repetir: “Aquilo que se dá pela porta, volta em dobro pela janela.”
04 de maio de 1957
Maria Cecília Bispo Brunetti
Acervo – Museu da Música – Itu