“Isto é o meu corpo” … “para a vida eterna” (1Cor 11, 24; Jo 6, 58) – Parte I
por Pe. Daniel Bevilacqua Santos Romano
Vigário na Paróquia Nossa Senhora do Monte Serrat – Salto/SP
O sacramento da Eucaristia é um assunto inesgotável para um único artigo, por isso, iremos nos deter brevemente em dois aspectos: o eclesiológico e escatológico.
O cristão nunca pode esquecer que a Eucaristia é o próprio sacrifício do Corpo e do Sangue do Senhor Jesus, que ele instituiu para perpetuar pelos séculos, até seu retorno, o sacrifício da cruz, confiando assim à sua Igreja o memorial de sua Morte e Ressurreição.
Neste sacramento há o mistério da união entre a teologia crucis e a teologia gloriae pois está contido na Eucaristia o maior bem espiritual da Igreja: o próprio Cristo, nossa páscoa.
O primeiro sinal eucarístico como centro de uma eclesiologia encontramos na Sagrada Escritura: “quando chegou a hora, ele se pôs à mesa com seus apóstolos e disse-lhes: ‘Desejei ardentemente comer esta páscoa convosco antes de sofrer; pois eu vos digo que já não a comerei até que ela se cumpra no Reino de Deus’” (Lc 22, 14ss). E nesta noite Ele entrega aos seus discípulos o Seu memorial.
O Senhor quis comer a páscoa com os seus! E quis ficar entre os seus! Ele não institui a eucaristia a sós, mas junto com os seus discípulos e deixa como mandamento a celebração deste memorial até que Ele venha. E toda vez que a Igreja se reúne para celebrar os santos mistérios, o sacerdote aclama o Corpo e o Sangue de Jesus dizendo: Mistério da fé! E toda Igreja: Anunciamos, Senhor, a vossa morte, proclamamos a vossa ressurreição. Vinde, Senhor Jesus! Aqui, a Igreja, ao mesmo tempo que apresenta Cristo no mistério da sua Paixão, revela também o seu próprio mistério: Ecclesia de Eucharistia.
Neste sacramento se esconde todo o mistério pascal de Cristo, naquele pedaço de pão transubstancializado se encontra toda ação salvadora de Jesus da qual somos convidados, como Igreja, a dela participar. E como do lado aberto de Cristo na cruz, no ápice do mistério pascal, nasce a Sua Igreja, podemos dizer que ela possui em suas entranhas este mistério pascal que é todo eucarístico. Por isso, o sacramento do altar está sempre no centro da vida eclesial; graças à Eucaristia, a Igreja renasce toda missa!
E em cada celebração eucarística, nos é entregue a grande novidade do amor. Rezamos a convite do sacerdote: “Felizes os convidados para o Banquete nupcial do Cordeiro. Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.” A Igreja contempla então o verdadeiro cordeiro imolado, o verdadeiro cordeiro pascal que se oferece livremente. Por isso que Cristo não deixa à sua Igreja, alguma coisa, mas entrega-se a Si mesmo. E vai mais além. Não Se limitou a dizer ‘isto é o meu corpo’, ‘isto é o meu sangue’, mas acrescenta: ‘entregue por vós, derramado por vós’.
A eucaristia tem em seu caráter a capacidade de oferecer esse vínculo eclesial entre os fiéis.
Ao participarmos do pão eucarístico, que é realmente Corpo do Senhor, entramos todos em comunhão com ele, e entre nós. Há um só pão, embora muitos, somos um só corpo, todos os que participamos do mesmo pão. Tornamo-nos membros deste corpo e ‘membros uns dos outros’.
Como formamos um só corpo com Cristo cabeça, a tendência dos membros é de seguir sua cabeça, seguir seu exemplo. Assim como Cristo se entregou, se deu a cada um de nós, devemos nós também nos doarmos por completo a cada irmão, amar a cada um até o fim (cf. Jo 13, 1), amar este corpo ao extremo amor.
Esse doar-se ao extremo, só é possível para a Igreja porque ela está cheia de Cristo, o centro de sua vida é a eucaristia; pela eucaristia cresce o vínculo de amizade entre Sua esposa e o Esposo. E nós, enxertados neste mistério pascal sobretudo pelo batismo, consolidamos através da participação no sacrifício eucarístico este vínculo. Assim, podemos dizer não só que cada um de nós recebe Cristo, mas também que Cristo recebe cada um de nós. Ele intensifica a sua amizade conosco.
A Igreja vive continuamente do sacrifício redentor, e tem acesso a ele não só através duma lembrança cheia de fé, mas também com um contato atual, porque este sacrifício volta a estar presente, perpetuando-se, sacramentalmente, em cada comunidade que o oferece pela mão do ministro consagrado. Deste modo, a Eucaristia aplica aos homens de hoje a reconciliação obtida de uma vez para sempre por Cristo para humanidade de todos os tempos.
Como dito na citação: para a humanidade de todos os tempos. Principalmente para aqueles que caminham rumo à vida eterna.
Continua…