Maria, concebida sem pecado
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Certa vez, em tempos em que eu às vezes ainda assistia à rede Globo e dava certo crédito ao que exibiam, o programa Altas Horas, de Serginho Groisman, apresentava uma entrevista com um jovem casal de namorados que, juntos já há bastante tempo, preservavam-se para o casamento, cultivavam a virgindade. Os dois alegavam que sexo e casamento são inseparáveis e que entendiam existir valores maiores que o prazer carnal, numa vida a dois.
Porém, o rapaz e a moça eram interrogados pela garotada como se questionassem a dois extraterrestes, dois alienígenas que de repente teriam aparecido na televisão. Via-se em seus semblantes, e nas perguntas formuladas, o espanto e até mesmo a indignação por aquele ideal de vida. E, por que não dizer, um certo deboche no tratamento do assunto.
Isso nos mostra a degradação moral que atinge a nossa juventude. O que ontem fora motivo de honra, hoje é motivo de espanto e vergonha. Um exemplo típico de inversão de valores.
É claro que nem todos pensam assim. Como aqueles jovens namorados, ainda existem casais que agem dessa forma, não absolutizando o prazer em suas vidas e acreditando que a melhor maneira de se preparar para um bom casamento é pela castidade. Mas, salvo essas raras exceções, a idéia do amor livre e descompromissado já faz parte da consciência da sociedade atual. Uma sociedade que não acredita ou não se importa com o pecado e com as suas conseqüências.
É nesse contexto de mundo que celebramos no dia 8 de dezembro a Imaculada Conceição de Nossa Senhora. No ano de 1854, após um longo processo de estudo e muitas considerações, o Papa Pio IX – beatificado no Ano Santo de 2000 – definiu como verdade de fé que Maria, em previsão dos merecimentos da Paixão e Morte de Cristo, foi preservada de toda a mancha do pecado, desde o primeiro instante da sua conceição. Foi a primeira “redimida”, tendo em vista que por ela e nela Jesus se encarnaria, irrompendo na História.
Num mundo que perde a cada dia a noção e consciência do pecado, que sentido terá lembrar que Maria foi concebida sem pecado? Falar em pecado original terá sentido numa sociedade em que domina a violência, a mentira, a corrupção, a imoralidade, o desrespeito a si mesmo e ao semelhante?
A solenidade da Imaculada Conceição de Maria, celebrada a cada ano (único dos quatro dias santos de guarda brasileiros que não é feriado e que neste ano cai num domingo), vem alertar-nos para essa realidade, vem convidar-nos a um retorno à Verdade. Vem abrir-nos os olhos para que tomemos consciência de que a verdadeira felicidade está em cumprir a Palavra de Deus e testemunhá-la ao mundo em que vivemos, mesmo que isso represente em sacrifício de nossa parte: “Eis a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1, 38).
A festa da Imaculada Conceição “nos faz meditar não só sobre a inefável beleza da alma de Maria, mas também sobre a beleza de toda alma santificada pela graça redentora de Cristo”. É para nós garantia de que o mal jamais prevalecerá sobre os que depositam em Deus a sua confiança: “Todas as gerações me chamarão bem-aventurada, porque o Senhor fez em mim maravilhas” (Lc 1, 48-49).
Assim, ao celebrarmos a Imaculada Conceição de Nossa Senhora, que a contemplação da beleza ímpar de Maria, “toda formosa” e em cuja alma não houve sombra de pecado, nos faça despertar para as suas gravíssimas consequências para o ser humano. E provoque no mundo um anseio de retorno à vida da Graça, que é a vida em Cristo.