Assédio moral ou afetividade cristã?

Na manhã de um sábado recente, estava eu na sala de espera de um consultório médico, acompanhando minha mulher num exame e consulta. Por mais que tentasse me concentrar na leitura de uma revista ou de notícias no telefone celular para ocupar o tempo entre uma coisa e outra, não tinha como deixar de ouvir o falatório que vinha de um televisor pendurado na parede, de um programa da rede Globo que, aliás, parece ser a única emissora sintonizável em consultórios, clínicas e afins. O apresentador entrevistava uma moça que se dizia feminista e, como no decorrer daquela semana transcorresse o “dia da empregada doméstica”, abordava temas inerentes à profissão, entre eles a crucial importância de não se dizer mais “empregado doméstico”, mas “trabalhador doméstico”.
Trocando em miúdos: a pessoa é desempregada, compõe as estatísticas do desemprego no país, percorre agências e empresas em busca de um emprego e até reza para ter um, mas quando o acha, não pode dizer que é empregada. É trabalhadora! Será porque para muitos dos que elaboram essas releituras filosóficas ter um emprego não significaria necessariamente trabalhar?
O pior estava por vir.
Chegou ao programa, para também ser entrevistada, uma senhora que teria sido por anos empregada – ops!, trabalhadora doméstica – e que agora era dirigente sindical no setor. Entre outros conceitos ensaiados, brindou os telespectadores – felizmente, àquele horário, somente os que, como eu, jaziam numa sala de espera médica – com a pérola de que o patrão dizer ao empregado “que ele é como se fosse da família” configura assédio moral… Sim, caros leitores, a esquerda revolucionária minou de tal forma os relacionamentos humanos que, na ânsia de melhorar as relações patrão-empregado, acaba por destruir até o que eventualmente já exista. Explicou a pobre senhora que muitos patrões se utilizam desse subterfúgio para exigir que seus empregados, sensibilizados com o tratamento, submetam-se e abram mão de salário justo.
Não duvido que essa situação tenha ocorrido, pois ainda teimo em acreditar que isso não tenha saído exclusivamente da cabeça dessa liderança sindical ou da justiça trabalhista, mas seria motivo para mais uma vez se realizar esse nivelamento por baixo e a exceção generalizar o assunto?
Penso isto porque conheci e conheço muitos, mas muitos mesmos, empregados que gozam do respeito e do afeto de seus patrões e de fato confundem-se com membros da família destes. Não bastasse o Brasil das últimas décadas ter jogado pretos e índios contra brancos, pobres contra ricos, alunos contra professores, empregados contra patrões… agora deseja eliminar o que – felizmente – sobrou em termos de relações entre estes últimos? Meu pai teve uma empregada de mais de 30 anos em seu comércio, que praticamente trocou nossas fraudas, esteve presente em aniversários, casamentos, natais e reuniões familiares; catequista, foi dela que ganhei meu primeiro tercinho que ainda guardo com carinho; quando um agressivo câncer a levou em apenas 15 dias, todos nós sofremos muito. Quer dizer que se nós a disséssemos membro da família a estaríamos assediando moralmente? Quando a tia que a criou e com quem morava adoeceu e por meses a deixamos em casa, cuidando da tia enquanto recebia não só o salário mensal, mas todos os direitos e recolhimentos a que fazia jus como nossa empregada, nós nos equivocamos? Melhor para essa militância alucinada é que, de forma fria e impessoal a mandássemos andar, pois “não era de nossa família”? Francamente!
Assim tem sido todo dia, toda hora. A cada manhã alguém desperta com uma ideia mirabolante desse tipo, fala dela com a propriedade de um filósofo grego e tá tudo bem, as pessoas assimilam e não tem um cristão pra contestar, até pra não ficar feio perante a coletividade sufocada pelas agendas globalistas internacionais. Uma hora implicam com a relação do patrão com seus empregados, outra com expressões que entendem preconceituosas e discriminatórias, outra com musiquinhas de carnaval, outra com a paquera da qual depende a perpetuidade da espécie humana, e por aí vai, até se chegar ao descalabro de se querer alterar até a língua portuguesa com as aberrações dos chamados pronomes e expressões “neutras”. E tudo fica bem! Maravilhosamente bem, nos ouvidos de uma sociedade que já se resignou à intelectualidade desses seres superiores que dizem com isso buscar um mundo mais justo e solidário.
Estejamos bem atentos aos movimentos dessa militância ideológica hoje penetrada em praticamente todos os setores da sociedade. Façamos oposição enérgica ao que deseja incutir em nossas mentes com a desculpa de nos tornar seres humanos melhores. E não deixemos de cultivar os valores cristãos que – estes sim – devem nortear a vida em comunidade.