O verticalismo da autoridade pontifícia
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Explicando o sentido da autoridade na Igreja, Paulo VI no discurso da audiência geral de 12.11.69 partiu do próprio conceito da instituição eclesiástica. A Igreja é uma comunhão espiritual e visível que inclui necessariamente os fatores de coesão, solidariedade, caridade e harmonia dos vários membros e grupos pertencentes ao seu corpo vivo. “A relação constitucional entre o poder e a obediência, estabelecida pelo Evangelho antes que pelo Direito Canônico, é também vítima da contestação sociológica que hoje está em moda” quer-se mudá-la e minimizá-la”- disse o Papa – “Negar não se pode, tanto bilha sua origem divina. Mas mudar, isto é, corrigir e aperfeiçoar, sim. A este aperfeiçoamento, incentivado pelo Concílio, se dizem dispostos os que têm responsabilidade na Igreja, os que exercem qualquer autoridade: diretiva, magisterial, pedagógica, administrativa e apostólica. Isto já se coloca no caminho de uma leal e manifesta realização. Todavia, este “modus in rebus” – tudo tem seu limite! Existem algumas ideias falsas a este respeito, e delas nos devemos precaver. Por exemplo: diz-se que autoridade é serviço. Justíssimo! No-lo recorda o Senhor na última ceia “quem governa seja como quer serve”. (Luc. 22,26)…
“São Gregório Magno nos deixou de si, como cabeça da Igreja e Pastor dos Pastores, a definição que ainda usamos em nosso protocolo pontifício: “Servo dos servos de Deus”. Esta fórmula porém, exata e exortativa, não anula o poder do Papa, como nenhuma outra fórmula semelhantes que se refira a qualquer legítima autoridade. A autoridade da Igreja é para serviço dos irmãos. Não a serviço de outro. Pois o objetivo da autoridade é o bem dos outros; não que os outros sejam a fonte da própria autoridade. A Igreja, no exercício da autoridade – para usar um termo corrente – é democrática no fim, na sua razão de ser. Não na sua origem, não derivando o seu poder da assim chamada “base”, mas de Cristo, de Deus, diante do qual é unicamente responsável.”
“Daí se segue outra importante particularidade: o poder eclesiástico não pode revestir-se das formas historicamente variáveis que ele assume no governo da sociedade civil, como quando o seu presidente apenas tem o ofício de legalizar o que a comunidade elaborou e decretou. O poder da Igreja conserva a liberdade e a iniciativa que o Senhor conferiu aos Apóstolos e à hierarquia, não só para a segurança da ordem exterior, senão para o bem quer dos fiéis em particular, quer da comunidade toda: aquele bem que coloca em primeira plana a dignidade, a liberdade, a responsabilidade, a santificação de todos e da cada um dos componentes do corpo eclesial.”
“Por isso, quando se diz hoje que não se contesta na Igreja a autoridade como tal, mas se critica o modo de exercê-la: está bem, com a condição de que a busca desse modo ideal não autorize o desligamento, isto é a desobediência, do modo real e legítimo com que autoridade exerce o seu mandato. O mesmo se diga do diálogo, que hoje leva a culpa de tantas discussões não só entre a Igreja e os que a circundam por fora, mas também entre os que estão dentro dela, ocupando aí posições e funções diversas. Ótima coisa o diálogo dirigido quanto ao respeito e à promoção da pessoa ou do grupo, diante do qual se deve urgir um determinado regulamento eclesial, ou se deve formar as consciências e os costumes, conforme os desígnios e o espírito de Cristo. Educar para a compreensão e o amor do que se manda é um progresso pedagógico, que exigirá grande paciência e sagacidade técnica.” (…)

Republicação de artigo do periódico A Cruz (RJ), de 14.12.1969 por iniciativa da Biblioteca Histórica (Igreja Bom Jesus).

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