Conto de Natal – No entremeio da existência
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Os efeitos da morte, algo recente – sete meses – ainda pairavam no ambiente familiar dos Oliveira e Sá. Conquanto não repentina, seria de se dizer que entre outras virtudes do falecido, encarou os fatos, cioso de tudo, como se desejasse que suas agruras não fossem percebidas pelos familiares.

Um esforço naturalmente frustrado.

Dona Celeste, além de seu porte decidido, ainda expandia otimismo, com saber guardar quase que para si o natural sofrimento, a poupar o tamanho da dor aos dois filhos.

Imperioso registrar ainda o aumento na frequência diária de vizinhos e parentes a assumirem até toda sorte de encargos e cuidados. Mas, concomitantemente também e sem menosprezo a ninguém, agradecida a todos, com retomar aos poucos o pulso de todos os encargos.

Mesmo assim não era pequena a oferta de comezainas e salgados, doces e bolos, trazida pelas amigas.
Uma particularidade.

A convicção religiosa da viúva que, além da missa de preceito semanal, habituou-se a participar, com relativa frequência, também em alguns dias úteis.

Comunicativa e de curso ginasial completo, viu-se convidada para fazer-se secretária da titular no setor de enfermagem, com salário condizente. Daí para frente abriu-se lhe um leque amplo de crescente sucesso, na mesma proporção ao inverso da primeira dama, esta infensa ao bulício da vida pública.

Salta à evidência que, em paralelo, Sérgio e Daniel, ao lado de sucessivos méritos da genitora e sob sua guarida de mãe devotada, cumpriram positivamente os seus passos, seguros, o primeiro como gerente geral de uma rede bancária e o outro como titular de próspera agência de turismo.

Do casamento do Sérgio com a advogada Nara, para gáudio da avó extremada, advieram os netos, um casal, ora com 8 e 12 anos, Vilma e Raul.

De sua vez e mais novo, Daniel, afeiçoou-se a repetidas viagens de recreio e, quando acompanhado, não ia além de meras e ocasionais amizades femininas.

A esta altura, recompostos na sociedade, residiam agora em casa ampla e confortável, sem luxos extremos. Chegou a hora de que também para a genitora se dispusesse de condução própria, aceita por ela, contudo, sob a condição de dispor de condutor particular e assim foi feito. E dezembro, a 15 dias de sua entrada oficial, já assanhava as famílias. Compreensivelmente, pelo apuro da novena de Natal se constituir na mais solene comemoração religiosa e cívica do município.

É solicitada a presença de Dona Celeste na sede da Paróquia.

E não deu outra.

Naquele ano ocorreriam os exatos vinte e cinco anos de fundação da Paróquia de Cristo Rei. A primeira pessoa lembrada para presidir todos os preparativos e comando na data. Sentaram-se durante mais de duas horas com sugestões de toda sorte.

Convite aceito sem resmungos nem titubeios.

– Vamos lá.

De volta para a casa e servir-se de pequeno lanche, recostou-se na alongada poltrona e, perdoem o lugar comum, deu tratos à bola, nos pormenores todos, repassados um a um.

E aqui entra a mais acentuada característica de dona Celeste, – voluntariosa e com respeito e prudência junto aos seus eventuais integrantes, tudo a imprimir um clima de sadias disputas em pormenores, novidades e envolvimento do público.

Sempre assistida de alguém da equipe, o primeiro contato deu-se com a pessoa do Prefeito, bem sucedida e a quase tranquilizar o aspecto financeiro.

Durante nove dias e particularmente na manhã de 25 de dezembro, os sinos badalaram ruidosamente.

O grosso da população amontoado em frente da Igreja Matriz.

Evidente que nesse grande lapso de tempo, a caracterizar dias melhores às famílias como um todo, auspiciosos tempos decorreram.

No entremeio da existência pacata, a maior emoção de sua gente.

(Foto em destaque: Imagem de tatlin por Pixabay)