Participação na Missa: vamos esclarecer
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Tem sido muito comum ouvirmos padres dizerem durante as missas que para que os fiéis delas participem ativamente é necessário que respondam em alta voz, cantem, cumprimentem-se e até gesticulem coreografias inventadas para cânticos e orações.

Alto lá! É necessário esclarecer o que de fato vem a ser a participação na santa missa, de acordo com os ensinamentos do magistério da Igreja, afastando uma interpretação incorreta que se tem dado ao tema.

Em primeiro lugar é preciso considerar que a missa, ato central do culto divino, é uma ação na qual o sacerdote oferece a Deus um sacrifício, o mesmo que ofereceu Cristo na cruz. A diferença é que Cristo o fez de forma cruenta, isto é, com derramamento de sangue, e o sacerdote o faz de forma incruenta, sem derramamento de sangue.

O caráter sacrifical fica bem claro para nós quando consideramos três momentos da missa em particular: o ofertório, onde o pão e o vinho são oferecidos a Deus; a consagração, quando acontece a separação do Corpo e do Sangue de Cristo (figura da morte); e a comunhão, onde, após a fração do pão consagrado o sacerdote comunga e distribui a Vítima Imolada aos fiéis.

Nesse sentido, não obstante seja louvável e até recomendável que a missa conte sempre com a participação de povo, ela tem um fim em si mesma – religioso, público e social – na medida em que o celebrante age em nome de Cristo (in persona Christi) e a oferece pela Igreja e pelos fiéis vivos e defuntos.

Os fiéis, povo sacerdotal por força do Batismo, participam desse augusto mistério unindo-se ao sacerdote que oferece o sacrifício em nome desse povo.

Com efeito, não é de hoje que os Sumos Pontífices vêm insistindo que os fiéis participem melhor e mais ativamente da santa missa. Porém, o que se recomenda é que ela seja uma participação real em uma ação da Igreja, estabelecida hierarquicamente por ordem de importância, e não uma participação meramente acidental, estabelecida por ordem de visibilidade. Assim, a participação do corpo deve ser subordinada à participação da alma, e a participação da vontade à do intelecto.

No entanto, e infelizmente, muitos enveredam por um caminho bastante duvidoso ao considerar ser mais importante que tenhamos uma assembleia respondendo em alta voz as partes que lhe competem na liturgia que uma assembleia que esteja compreendendo o que está se passando e que esteja, em sua alma, efetivamente participando.

Essa busca desenfreada pela participação exterior tem como resultado sacerdotes que muitas vezes comportam-se como animadores de auditório, gritando: “mais alto!”, “está fraco!”, “não ouvi!”, ou então músicas completamente alheias ao espírito litúrgico, cumprimentos e outras iniciativas que fazem com que os fiéis se sintam ilusoriamente envolvidos no culto, descuidando, contudo, de um envolvimento de alma.

O Papa Pio XII, em sua encíclica sobre a Sagrada Liturgia Mediator Dei, afirma ser necessário “que todos os fiéis tenham por seu principal dever e suma dignidade participar do santo sacrifício eucarístico, não com assistência passiva, negligente e distraída, mas com tal empenho e fervor que os ponha em contato íntimo com o sumo sacerdote, como diz o Apóstolo: ‘Tende em vós os mesmos sentimentos que Jesus Cristo experimentou’ (Fl 2,5), oferecendo com ele e por ele, santificando-se com ele” (n. 73).

Isso “exige de todo cristão que reproduza em si, quanto esteja nas possibilidades humanas, o mesmo estado de alma que tinha o divino Redentor quando realizava o sacrifício de si mesmo: a humilde submissão do espírito, isto é, a adoração, a honra, o louvor e a ação de graças à majestade suprema de Deus; mais, reproduza em si mesmo a condição de vítima, a abnegação segundo os preceitos do evangelho, o voluntário e espontâneo exercício da penitência, a dor e a expiação dos próprios pecados. Numa palavra, que todos espiritualmente morramos com Cristo na cruz, de modo a podermos dizer com São Paulo: ‘Estou pregado na Cruz com Cristo’ (Gl 2,19)” (n. 74 – destaquei).

O próprio Concílio Vaticano II, em sua constituição sobre a Sagrada Liturgia Sacrosantum Concilium, ensina que é necessário “que os fiéis celebrem a Liturgia com retidão de espírito, unam a sua mente às palavras que pronunciam, cooperem com a graça de Deus, não aconteça de a receberem em vão (n. 11). Recomenda ainda que os fiéis “participem na ação sagrada, consciente, piedosa e ativamente, por meio de uma boa compreensão dos ritos e orações; sejam instruídos na palavra de Deus; alimentem-se na mesa do corpo do Senhor; dêem graças a Deus; aprendam a oferecer-se a si mesmos, ao oferecer juntamente com o sacerdote, não só pelas mãos dele, a hóstia imaculada; que, dia após dia, por meio de Cristo mediador, progridam na união com Deus e entre si, para que finalmente Deus seja tudo em todos” (n. 48 – destaquei).

Nesse sentido, participa muito mais da santa missa a velha senhora que muitas vezes está a rezar o terço durante ela (prática hoje condenada pela maioria dos nossos padres), ou nela permanece em total silêncio e de olhos baixos, mas percebe que está diante do mais belo e profundo mistério, que a pessoa que responde aos brados, senta-se e levanta-se mecanicamente, cumprimenta toda a igreja no “abraço da paz”… mas não se dá conta do que está acontecendo no altar.

Naquele momento a grandeza do sacrifício de Cristo na cruz é tornado novamente presente no altar, como dito, de forma incruenta, mas tão real quanto a existência de nosso coração ou cérebro, e não nos damos conta disso, preocupados com manifestações exteriores muitas vezes vazias e sem sentido, em que o mistério é aniquilado em um ambiente nada propício à oração e ao enlevo da alma. A vontade age movida pelos sentidos, pelo ritmo da música, pelo clima de amizade aos que estão em volta, mas não pelo intelecto, pela percepção do grande milagre que acontece diante de todos.

É bem verdade que o mesmo Pio XII, na citada encíclica, não quer que sejamos exclusivistas em determinar o modo como os fiéis deverão participar da santa missa quando ressalva que “nem todos são capazes de compreender corretamente, como convém, os ritos e as cerimônias litúrgicas. A inteligência, o caráter e a índole dos homens são tão vários e dessemelhantes que nem todos podem igualmente impressionar-se e serem guiados pelas orações, pelos cânticos ou pelas ações sagradas feitas em comum. Além disso, as necessidades e as disposições das almas não são iguais em todos, nem ficam sempre as mesmas em cada um” (n. 98).

Assim, qualquer maneira de participar da santa missa que vise externar sentimentos internos de adoração, ação de graças, expiação e impetração de favores é boa. Todavia, desde que se parta do princípio de que essa participação não se mede pela quantidade de palavras, cânticos ou gestos, mas por uma íntima união ao sacerdote no oferecimento do Sacrifício Eucarístico.