Homenagem à Congregação Mariana do Carmo em seu Centenário – III

O bispo brasileiro Dom Fernando de Arêas Rifan, da Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney, em seu artigo “A Fé em perigo”, conta que no ano de 2001 assistia admirado, na Praça de São Pedro, em Roma, à chegada de milhares de fiéis do movimento Kolping, vindos da Alemanha, sobretudo homens, cantando com entusiasmo contagiante. Comentou então com um cardeal alemão que estava ao seu lado: “Diante disso, Eminência, não se pode dizer que a Alemanha não seja um país católico!” O cardeal, porém, observou, acalmando um pouco o seu entusiasmo: “É, mas a fé sempre corre perigo!”. Era o Cardeal Joseph Ratzinger, então prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé e hoje Papa Bento XVI.
A preocupação do Santo Padre com a fé é notória ao longo de seu pontificado, tanto em seus escritos e exortações quanto em sua reiterada insistência na seriedade e fidelidade à Liturgia como forma de manter a unidade da Igreja e da fé por ela professada. Não deseja Sua Santidade uma fé vaga e emocionada, mas uma fé racional, que entenda Deus como a essência do existir humano e o ponto de partida para todas as nossas ações. “Desde o princípio do meu ministério como Sucessor de Pedro, lembrei a necessidade de redescobrir o caminho da fé para fazer brilhar, com evidência sempre maior, a alegria e o renovado entusiasmo do encontro com Cristo… Sucede não poucas vezes que os cristãos sintam maior preocupação com as consequências sociais, culturais e políticas da fé do que com a própria fé, considerando esta como um pressuposto óbvio da sua vida diária. Ora, tal pressuposto não só deixou de existir, mas frequentemente acaba até negado. Enquanto, no passado, era possível reconhecer um tecido cultural unitário, amplamente compartilhado no seu apelo aos conteúdos da fé e aos valores por ela inspirados, hoje parece que já não é assim em grandes sectores da sociedade devido a uma profunda crise de fé que atingiu muitas pessoas. Não devemos aceitar que o sal se torne insípido e a luz fique escondida… Devemos readquirir o gosto de nos alimentarmos da Palavra de Deus, transmitida fielmente pela Igreja, e do Pão da vida, oferecidos como sustento de quantos são seus discípulos…”, escreveu o Santo Padre na Carta Apostólica Porta Fidei, pela qual proclamou o “Ano da Fé”.
É nesse contexto que visualizamos o papel da Congregação Mariana, ou seja, de mostrar ao homem que vive nesse “deserto” que Deus até pode ser um mistério, mas jamais um absurdo.
Se há 90 anos a população no Brasil era eminentemente rural e por terra de missão entendiam-se os mais longínquos rincões do país, hoje a terra de missão está à nossa volta, no convívio social que tivermos, no ambiente de trabalho, em nossa família, dentro de nossa própria casa… É nesse ambiente em que os congregados do século XXI são chamados a testemunhar a sua fé em Jesus Cristo. Devemos mostrar ao mundo que crer realmente vale a pena e que uma fé convicta, consciente, é a única capaz de mudar radicalmente o indivíduo, a família, a sociedade.
O congregado mariano deve fazer valer a fama que lhe foi atribuída, de “cristão com sinal +”, sendo o sal da terra e a luz do mundo nesse tempo onde os desafios são muito maiores. Não estamos aqui por acaso. “Porque, a quem muito se deu, muito se exigirá. Quanto mais se confiar a alguém, dele mais se há de exigir”, lemos em Lucas 12, 48.
Enquanto tantas e tantas associações religiosas, movimentos e irmandades sucumbiram ao longo dos anos, a Congregação Mariana do Carmo, muito embora tenha passado por momentos difíceis em sua existência, venceu-os e cruzou o século, atravessou os tempos com altivez, sustentada pelo manto azul, que nesta igreja é marrom, de sua maior fonte de inspiração, a Virgem Santíssima. Diante daquele altar cada um de nós um dia se ajoelhou e prometeu à Virgem do Carmo amor e serviço: “Firmemente proponho servir-vos sempre e fazer quanto puder para que dos mais sejais também fielmente servida e amada”. É essa a nossa missão.
Ao ingressarmos oficialmente na última década que nos separa do nosso centenário, queremos agradecer a Deus por tudo que pudemos fazer até aqui, plenamente conscientes de que foi pouco à vista do que deveria ter sido feito, mas foi o que nos foi possível, o que estava ao nosso alcance. Pedimos que receba, querida Mãe, a dádiva desses seus filhos consagrados e perdoe-nos pelas muitas vezes em que nos esquecemos de nossas responsabilidades e do compromisso assumido.
A celebração de um aniversário, não tem dúvida, é um momento de ação de graças pelos dons recebidos ao longo da existência. No caso da Congregação Mariana do Carmo, celebrar este jubileu é momento de agradecer a Deus e à Virgem Santíssima por todo o fruto espiritual que produziu em seus membros e nesta comunidade com suas orações e atos devocionais; pelo conforto oferecido aos doentes que visitou e assistiu; pelo bem que dispensou a todos os que atendeu em seu ambulatório; pelo conhecimento da religião que proporcionou através do jornal “Salve Maria”; pelas liturgias que enriqueceu com seu coro; pelas procissões e atos cívicos que abrilhantou com a sua banda de música; pelos momentos de recreação e alegria que ofereceu à comunidade com suas peças teatrais, com seu time de futebol ou partidas de pingue-pongue.
Mas, a celebração deste jubileu, antes de tudo, é um momento de profunda reflexão. Momento de, olhando para trás, fincarmos o pé no presente, recobrarmos forças e seguirmos adiante. O desafio que a Santa Igreja nos propõe hoje deve alentar o nosso futuro de modo a fazer-nos cada vez mais apaixonados pela causa de Cristo e do Evangelho. O mundo é uma terra de missão, que precisa de cristãos autênticos e capazes de dar ao homem moderno o testemunho de uma fé decidida e incondicional. O mundo precisa da fé. O mundo precisa dos congregados marianos. O mundo precisa de nós.
Congregados, levantem-se e comam que o caminho é longo! Salve Maria!
(Terceira e última parte do discurso proferido na igreja do Carmo de Itu em 24 de novembro de 2012, festa de Cristo Rei, nas comemorações dos 90 anos da Congregação Mariana)